São Paulo, domingo, 21 de dezembro de 1997
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Cavallo quer aliar política e jornalismo

LÉO GERCHMANN
DE BUENOS AIRES

O ex-ministro argentino Domingo Cavallo (Relações Exteriores de 89 a 91 e Economia entre 91 e 96) revelou, em entrevista concedida à Folha, que se prepara para assumir uma atividade de colaboração e consultoria na revista norte-americana "Forbes".
Além de escrever artigos e divulgar a revista pelo mundo afora, o ex-ministro dará consultorias à edição internacional da "Forbes", que entrará no mercado em 98 e se dedicará às economias de países que não sejam os EUA e o Canadá.
"É um desafio. Será a minha primeira experiência no jornalismo. O importante é que isso não vai afetar minha carreira política", disse, mantendo o sorriso tímido que o caracteriza ao falar de assuntos que o deixam pouco à vontade.
Cavallo não se cansa de elogiar a equipe econômica brasileira. Sobre o ministro da Fazenda, Pedro Malan, aliás, o ex-ministro argentino afirmou que o convidaria para ser seu ministro.
Nesta entrevista, Cavallo fala do Brasil, do futuro, de economia e de política. Entre outros assuntos, aborda a sua candidatura presidencial e lança uma sugestão para combater o desemprego: realizar uma reforma trabalhista para as micro e pequenas empresas (com no máximo 200 empregados).
*
Folha - O senhor fez várias viagens ao Brasil em 97. Sobre o que falou?
Domingo Cavallo - Me encontrei com grupos de investidores internacionais e participei de conferências empresariais.
Folha - O que o senhor tem falado sobre o Brasil para esses investidores?
Cavallo - Que o governo brasileiro está tomando as medidas certas em relação ao momento difícil que está vivendo. O custo recessivo será menor do que aquele que poderia ser. É importante que os investidores entendam e acreditem nisso, para que os juros baixem e para que o custo recessivo seja ainda menor.
Folha - Qual o perfil ideal para ser seu ministro da Economia caso o senhor seja eleito presidente? O senhor sempre diz que gosta muito de Pedro Malan. Se fosse argentino, seria um dos nomes cotados?
Cavallo - Se for presidente, eu convidarei para ser ministro da Economia da Argentina a Adolfo Sturnegger, que tem um perfil profissional muito parecido com o de Malan. Mas Pedro Malan tem a vantagem de que, não só é profissionalmente muito capaz, como tem uma trajetória como funcionário de alto nível. Já foi negociador da dívida externa, presidente do Banco Central.
Folha - O senhor confirma a sua candidatura? Haveria a possibilidade de se aliar a alguém? Ao governador de Buenos Aires, Eduardo Duhalde, por exemplo?
Cavallo - Serei candidato. A minha intenção é pelo menos mostrar a cara. Num segundo turno, pode ser. Mas, assim como tenho com Duhalde, tenho amizade com pessoas ligadas à oposição, como o Chacho Alvares (deputado eleito pela Aliança UCR-Frepaso e integrante da Frepaso).
Folha - E a sua participação na Forbes, da qual o senhor estava falando antes desta entrevista, será a primeira experiência no ramo?
Cavallo - A Forbes decidiu lançar uma edição internacional, para o público mundial e com um enfoque atrativo para leitores não-norte-americanos. Então, convidaram-me. Terei a responsabilidade de escrever uma coluna a cada número da revista (que é quinzenal), fazendo comentários sobre eventos mundiais, mas com uma visão de alguém que vive em um país emergente. Essa é a minha primeira experiência jornalística. É um grande desafio. O bom é que terei uma atividade compatível com a atividade política na Argentina.
Folha - Qual a melhor receita para combater o desemprego?
Cavallo - É necessário simplificar muito mais do que se tem feito no Brasil e na Argentina. As normas trabalhistas e os requisitos de contratos trabalhistas, quando o empregador é uma pequena ou média empresa, com menos de 200 pessoas, em todos os setores da economia, deveriam ser mais simples, mais fáceis de cumprir. Quando as normas são muito exigentes e difíceis de cumprir, e quando os impostos são muito elevados, condena-se essas empresas a não existir ou a trabalhar na informalidade.
Folha - Deveria haver uma reforma trabalhista para pequenas e médias empresas?
Cavallo - É isso que proponho na Argentina. Se não se diferencia as pequenas e médias empresas de um lado e as grandes empresas de outro, o mais provável é que as normas sejam pensadas para as grandes corporações empresariais e sindicais, não sendo realistas para pequenas e médias empresas.
Folha - O senhor considera boas as soluções encontradas pelo Brasil para a crise provocada pela queda das Bolsas?
Cavallo - O Brasil tem uma equipe econômica de ótima qualidade. A opção por não desvalorizar a moeda foi uma demonstração disso. A situação já era difícil e uma certa recessão é inevitável, mas poderia ter sido muito pior.
Folha - O senhor acredita que a Argentina e o Brasil modificarão os seus modelos econômicos em função da crise? A Argentina deixaria a paridade entre o peso e o dólar, e o Brasil teria de desvalorizar o real?
Cavallo - Nem uma coisa nem outra. Isso seria muito ruim para a economia dos dois países, terminaria com uma estabilidade que é fundamental.
Tanto a Argentina manterá a convertibilidade (a paridade fixa entre o peso e o dólar), quanto o Brasil não desvalorizará o real. Isso não pode ocorrer.
Folha - O que o senhor acha do acordo realizado entre a Argentina e o FMI? Recomendaria o mesmo para o Brasil?
Cavallo - O acerto da Argentina com o FMI foi importante para dar segurança aos investidores internacionais. No caso do Brasil, as medidas adotadas seriam as sugeridas pelo FMI. Por isso, não vejo porque deixar de aceitar a possibilidade de contar com os recursos do fundo em caso de necessidade.

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