São Paulo, terça-feira, 23 de dezembro de 1997
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Juros devem cair pouco

CELSO PINTO

A reação do mercado financeiro à decisão recente do Banco Central de reduzir as taxas de juros leva a duas conclusões. A percepção é que é alto o risco de a crise se manter no médio prazo e baixa a chance de os juros caírem mais fortemente nos próximos meses, "a menos que surjam muito boas notícias, sobretudo no front externo".
A análise é do economista Márcio Garcia, da PUC do Rio. Para chegar a essas conclusões, Garcia comparou o comportamento dos mercados futuros de juros nos últimos meses.
Na Bolsa de Mercadorias e de Futuros (BM&F), é possível negociar contratos de juros (DI, Depósitos Interfinanceiros) vencendo nos meses seguintes. No caso de juros para um ano, a indicação aparece nas operações de troca ("swaps") de taxas DI por taxas prefixadas para o prazo de um ano. Garcia considerou os três primeiros vencimentos da BM&F, que são os mais significativos em volume, e as taxas de um ano medidas pelo "swap". Normalmente, a curva de juros é positivamente inclinada, ou seja, quanto maior o prazo, maior a taxa de juros exigida pelo investidor. Às vezes, contudo, a curva de juros futuros é invertida: quanto maior o prazo, mais baixos os juros.
Uma razão típica para ocorrer uma curva invertida é quando o BC eleva os juros para combater a inflação. Se os mercados acreditarem que a inflação, de fato, vai cair, os juros futuros poderão ser mais baixos do que os juros de curto prazo.
Antes da confusão asiática em outubro, a curva de juros no Brasil era positiva. No dia 24 de outubro, os vencimentos nos três primeiros vencimentos futuros de juros iam de 21,165% a 21,663%. A taxa de um ano era de 22,229%.
Quando a crise estourou, aumentou o risco de longo prazo. A primeira reação do mercado foi elevar a expectativa de juros futuros, antes mesmo da decisão do BC de subir os juros. No dia 27 de outubro, as taxas já variavam de 21,214% no primeiro mês a 24,379% em um ano.
Os juros futuros continuaram aumentando até a decisão do BC de dar um salto nos juros. A reação imediata do mercado foi passar a trabalhar com uma curva de juros invertida: a taxa de juros no mês seguinte ficou em 40,698%, enquanto a taxa de um ano era bem menor, 34,167%. A lógica era óbvia. O aumento decidido pelo BC foi tão forte que passou a fazer sentido supor que os juros, no futuro, seriam declinantes.
Essa estrutura se manteve nas semanas seguintes, com oscilações. Todos os juros subiram, de início, com a complicação da crise externa e caíram depois do anúncio do pacote fiscal e das decisões positivas do Congresso em relação às reformas.
Quando o BC decidiu reduzir pela primeira vez os juros, em 19 de novembro, a reação dos mercados futuros foi positiva. Todos os juros recuaram e quanto mais longo o prazo, menor o juro. No dia 20 de novembro, os juros para o primeiro mês estavam em 42,969%, caindo até 38,338% na taxa de um ano.
No entanto, quando o BC anunciou a segunda redução dos juros, na última quarta-feira, a reação do mercado foi muito diferente. Nos dois dias seguintes de negociações, depois da decisão, os juros foram declinantes para os três primeiros vencimentos futuros, mas subiram no caso dos juros para um ano.
A interpretação de Garcia é que, hoje, o mercado aposta numa redução dos juros a curto prazo, mas continua desconfiado sobre o longo prazo. Aumentou a suspeita de que a crise não é temporária, fazendo com que subisse o prêmio exigido no mercado para os juros de um ano de prazo. Ao ser bastante conservador, reduzindo muito pouco os juros, o BC reforçou o conservadorismo do mercado. Daí as duas conclusões de Garcia. Uma, a de que o risco de se ter uma crise a médio prazo, no horizonte de um ano, "é ainda bastante significativo". A outra, a de que não deve haver redução significativa de juros nos próximos meses, a menos que surjam notícias muito positivas, principalmente no mercado externo.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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