São Paulo, sábado, 27 de dezembro de 1997
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Desrespeito a portadores de deficiências continua

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Mais um ano se passou e os direitos das pessoas portadoras de deficiências físicas, assegurados pela Constituição, continuam sendo desrespeitados.
No último dia 10, Lara de Campos Siaulys, que é cega de nascença, deixou de fazer o vestibular Univest, que congrega seis universidades de São Paulo e é organizado pela Cesgranrio, porque não havia prova em braile.
Quando fez a inscrição no Univest, Lara anexou uma carta solicitando a prova em braile.
No dia e no local da prova, Lara soube que não poderia usar sua máquina de escrever em braile e que uma pessoa (ledor) leria as questões e anotaria as respostas.
Lara disse que o teste até poderia ser feito assim, mas a redação teria que ser escrita por ela. Responderam que não, ela ditaria o texto e o ledor escreveria no papel. Ela disse que não teria condições de fazer a prova assim e foi embora.
"Nós organizamos concursos públicos e vestibulares e temos ledores especializados para atender as pessoas portadoras de deficiência visual. Não fazemos a prova em braile por questão de segurança, para garantir o sigilo do exame. Entendo a opção dela de não fazer a prova, mas o ledor sempre foi satisfatório. Nunca tivemos problemas", diz Vera Tavares, diretora acadêmica da Cesgranrio.
"Senti-me lesada, discriminada. Poderiam ao menos ter-me avisado antes. Prestei vestibular em várias outras universidades e não tive problemas", declara.
"O que aconteceu com Lara é um absurdo. Ela tem direito a fazer vestibular como qualquer outro estudante", afirma Antonio Carlos Malheiros, juiz do 1º Tribunal de Alçada Civil (TAC) de São Paulo.
Luiz Alberto David Araújo, professor de direito constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), vai além em sua reflexão sobre o caso.
Ele pergunta se a linguagem usada nas provas dos vestibulares e o tempo estipulado devem ser os mesmos para todos.
"A linguagem dos surdos é diferente. Será que a gramática deles é igual? E os cegos, será que a prova em braile precisa de mais tempo para ser realizada? É preciso começar a pensar no assunto", sugere.
Outra situação constrangedora para os portadores de deficiências físicas é causada pelas portas de segurança das agências bancárias -giratórias ou duas portas de correr que formam uma antecâmara na entrada, ambas com detectores de metais-, que impedem a entrada do usuário de cadeira de rodas.
Algumas agências possuem uma porta lateral, que abrem para essas pessoas. Mas entre a chegada ao banco e a entrada, há sempre uma desagradável espera do lado de fora. Na saída, a mesma espera, só que do lado de dentro.
Nas agências sem a porta lateral, um funcionário desloca-se para atender o cliente na ante-sala, onde ficam os caixas automáticos.
"É um absurdo. Eu tenho o direito de ser atendido como qualquer outra pessoa. Nem pior, nem melhor", desabafa o paraplégico Hildo Afonso de Figueiredo.

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