São Paulo, quarta-feira, 31 de dezembro de 1997 |
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Tim Parks analisa a confusa moral européia
MARCELO REZENDE
Menos conhecido -ou publicitário- que seus companheiros de geração, como Martin Amis, Julian Barnes ou Ian McEwan, Parks é um inglês auto-exilado em Verona, Itália, que durante anos foi adorado pela crítica dos EUA e de seu país, mas se manteve distante do grande público. Com "Europa", seu mais recente trabalho, lançado no início deste ano, Parks conseguiu uma indicação ao Booker Prize, o prêmio literário de maior prestígio no Reino Unido. Foi derrotado pela indiana Arundhati Roy e seu "O Deus das Pequenas Coisas", mas conseguiu maior atenção. E vendas. "Cara Massimina", editado originalmente em 1990, conta a patética trajetória de Morris Duckworth, um professor de inglês sem muito caráter que vive sob os prazeres do sol italiano. Duckworth dá aulas para uma inocente e adolescente herdeira, Massimina. Ela se apaixona por seu mestre e ele por sua fortuna. Os dois fogem. Massimina pensa estar vivendo um idílio romântico. Seus pais, pelas mensagens enviadas por Duckworth, sabem que ela é vítima de um sequestrador. Em entrevista por correio eletrônico, Tim Parks falou à Folha sobre "Cara Massimina", a literatura de humor e a Europa unificada. Leia trechos abaixo. * Folha - "Cara Massimina" é uma obra que se prende, ainda que com humor, à tradição do romance policial? Tim Parks - Obviamente, "Cara Massimina" oferece os prazeres do "thriller" e da comédia. Por outro lado, penso, possui um personagem "moderno", no sentido em que ele tem uma consciência que é fruto do modernismo. O livro se torna uma comédia, ou história de horror, em consequência das justificativas dadas pelo personagem, um ser capaz de justificar e ver como boas as suas piores ações. Morris possui a atraente qualidade de analisar com precisão as falhas de todos aqueles ao seu redor, e isso o torna atraente para o leitor. Ele gosta de Morris. Folha - O enredo, a maneira que é contado, aproxima o livro dos satíricos britânicos? Parks - A resposta é sim. O romance pertence à longa tradição da sátira britânica e européia, em que a perspectiva distorcida do protagonista desorienta o leitor, que é forçado a descobrir quais são as suas próprias crenças. Folha - Um protagonista britânico vivendo na Itália e o mergulho nos costumes da Europa. Mais do que um romance inglês, o sr. pretendia escrever um romance europeu? Parks - Eu escrevi "Cara Massimina" há muitos anos, pouco tempo depois de me mudar para a Itália. A influência de um "romance europeu" não é muito forte. De qualquer maneira, a Itália é importante. A versão italiana do catolicismo, que permite a fácil coexistência de uma fachada moral e uma realidade muito mais amoral (mediada pela confissão), dá a Morris um bom campo para agir. Minha ficção se interessa muito por esse ponto. Não apenas as diferenças de moral entre o mundo anglo-saxão e latino, mas os diferentes tipos de consciência que eles geram. A obsessão anglo-saxônica (e norte-americana) com a integridade conduz a um processo torturante de autojustificação. Isso oferece um material melhor para a sátira. Folha - "Europa" é também uma sátira moral? Parks - Escrito sete anos depois de "Cara Massimina", "Europa" é um romance muito diferente, influenciado pela leitura dos franceses, alemães e italianos. Mas há algo de comum. Há uma tendência na Itália, por exemplo, em ver a União Européia como algo bom em si mesmo, além de qualquer debate. E esse mesmo "bem" é usado como justificativa para interesses pessoais. O livro vê a comunidade européia com uma face virtuosa, uma máscara que esconde os mesmos velhos jogos. O livro é muito inglês no ceticismo em relação às "idéias européias". Não que eu seja um antieuropeu. Sou apenas fascinado com a ambiguidade que essas idéias ocupam na consciência européia moderna. Minha literatura é uma tentativa de mostrar essa consciência em ação. Folha - Nascerá, com a União Européia, um novo tipo de escritor? Parks - Eu não acredito nessa possibilidade, em um "escritor europeu", sem nacionalidade. Pelo contrário. Acho que o velho paroquialismo está mais vivo do que nunca. Existirão aqueles que serão capazes de vencer provincianismo e outros que ficarão presos a ele. Vivo na Itália há 18 anos. Minha mulher é italiana e italiano é a primeira língua de meus três filhos. Por anos trabalhei como tradutor e falo italiano a maior parte do tempo. Como pode outro país, esse país, não ser importante? Não o escolhi, no sentido em que tinha um projeto. Eu simplesmente me apaixonei por uma mulher em Boston que, por acaso, era italiana. É interessante pensar que italianos e ingleses sempre definiram a si mesmos por contrastes quando comparados uns aos outros. Sem qualquer dúvida, meu trabalho se alimenta dessa experiência. Livro: Cara Massimina Autor: Tim Parks Lançamento: Imago Quanto: R$ 22 (247 págs.) Texto Anterior: Coluna Joyce Pascowitch Próximo Texto: Autor satiriza os ideais do continente Índice |
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