São Paulo, sábado, 1 de fevereiro de 1997
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Alianças e ameaças

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Políticos profissionais e jornalistas nem tanto mostram-se escandalizados com a falta de coerência de alguns elementos da esquerda que estão "de mãos dadas" com tradicionais lideranças da direita, como Paulo Maluf. Não sendo eu da esquerda, nem da direita, nem de cima, nem de baixo, por apenas observar o circo com a secreta vontade de vê-lo pegar fogo -o que me leva a compreender a alma encantada dos palhaços-, fico também escandalizado com a falta de coerência máxima deste país.
Lembro uma frase de Churchill durante a 2ª Guerra Mundial. Algumas lideranças conservadoras da Inglaterra achavam que ele exagerava ao se aliar a Stálin -que parecia a esses conservadores mais nocivo do que Hitler. Churchill respondeu: "Se o demônio for contra Hitler, eu me aliarei ao demônio!".
Não estou comparando Maluf ao demônio. Pelo contrário: acho que foi uma bobagem da esquerda tentar demonizá-lo naquela eleição indireta. Outra coisa: sua posição atual, contra a reeleição, é obviamente pessoal, em tudo semelhante à de FHC.
Gosto de lembrar o que aconteceu com a Alemanha depois da subida de Hitler ao poder. Toda vez que aparece uma liderança personalista que passa por cima da ética e dos bons costumes, sempre me lembro da mania nazista de achar que sem o führer não haveria salvação para a pátria em perigo. É lícito, e mais, é conveniente suspeitar dos salvadores da pátria.
Tenho repugnância em imaginar a eventualidade de FHC tornar-se um monstro. Não faz o chamado gênero do brasileiro comum, embora essa história de "brasileiro cordial" seja uma lenda como a da mula-sem-cabeça. Mas é da massa dos insensíveis, dos que colocam a ambição pessoal acima dos valores morais que surgem os monstros da história. A maneira pela qual FHC vem lutando pelo próprio interesse já constitui ameaçadora monstruosidade.

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