São Paulo, segunda-feira, 3 de fevereiro de 1997
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Pesquisa mostra falhas de vale-educação

FERNANDO ROSSETTI
DE NOVA YORK

O vale-educação -uma das propostas de financiamento do ensino mais divulgadas no mundo atualmente- sofreu contundentes críticas na semana passada, em Nova York, com a apresentação de uma pesquisa que avalia as poucas experiências práticas realizadas no mundo com ele.
Arquitetado em 1955 pelo economista Milton Friedman, Prêmio Nobel da Universidade de Chicago, o projeto do vale-educação propõe que o Estado, no lugar de repassar dinheiro à sua rede de ensino, deve dar um vale ao aluno, que com ele paga a escola que quiser, pública ou particular.
A idéia central é que isso obrigaria as escolas públicas a disputarem alunos com as escolas particulares para poderem receber dinheiro -e, consequentemente, conseguirem se manter e pagar seus professores.
Teoricamente, com a competição, a qualidade geral do ensino -público e particular- melhoraria, e seu custo diminuiria.
Outra vantagem, segundo os propositores da idéia, é que os alunos de baixa renda passariam a ter poder aquisitivo para estudar em escolas privadas que fossem melhores do que as públicas.
Estado mínimo
A proposta é adequada à atual defesa do chamado "Estado mínimo" -ou seja, de suspender a participação do governo em toda e qualquer atividade que possa ser desenvolvida pelo setor privado.
Embora exista desde meados do século, a idéia só começou a ser testada com pequenos projetos-piloto na década de 70, em alguns países europeus. Lá, na maioria dos casos, o uso dos vales ficou restrito ao pagamento de escolas religiosas sem fins lucrativos, para famílias que prefiram essas instituições às escolas públicas laicas.
O modelo mais conhecido hoje é o do Chile, implantado pelo regime militar na década de 80. A Suécia também fez experimentos com o vale-educação de 92 a 95, e os EUA estão desenvolvendo projeto-piloto no Estado de Milwaukee.
"Pelo que pude observar, o vale-educação tem, na verdade, aumentado a diferença entre a qualidade da educação recebida pelos mais ricos e pelos mais pobres", afirmou o professor de economia da educação da Universidade Stanford Martin Carnoy.
Baixa renda
"Isso contraria exatamente o que os defensores do vale-educação dizem ser sua maior vantagem: o ganho educacional para as famílias de baixa renda", disse Carnoy, em seminário promovido pelo grupo Prioridades Educacionais, um coletivo de 26 entidades civis que atua em Nova York.
Em seu artigo científico de 31 páginas, Carnoy confronta com dados de 35 livros e relatórios de pesquisa cada argumento dos propositores do vale-educação.
Segundo ele, não há qualquer dado de desempenho de alunos em testes de proficiência que mostre definitivamente que o vale-educação melhora o ensino. "No caso do Chile, o que se vê é até o contrário", disse o economista.
"Os dados indicam que os pais, quando ouvidos em pesquisa, se sentem melhor em poder escolher a escola de seus filhos. Mas esta possibilidade de escolha é, na maioria dos casos, pouco exercida" (veja quadro).
"Para os mais pobres, que têm mais dificuldade para pagar transporte, a possibilidade de escolher uma escola diferente ou melhor distante de casa se torna limitada", afirmou Carnoy, que tem título de doutor em economia pela mesma escola de Chicago onde o vale-educação foi gestado.

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