São Paulo, terça-feira, 4 de fevereiro de 1997
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A regra que decide

JANIO DE FREITAS

Estivéssemos ainda no tempo em que Câmara e Senado compunham um poder independente -o Poder Legislativo, extinto quando criada, em 95, a conjugação de governo por medidas provisórias e de votações no Congresso por compra- hoje e amanhã seriam dias interessantes, dadas as eleições com candidaturas potencialmente muito competitivas para as presidências do ex-Senado e da ex-Câmara.
Poucas serão as dúvidas, se existirem, de que o senador Iris Rezende reúne e, com larga vantagem, as preferências dos seus colegas. É mais tratável do que seu competidor Antonio Carlos Magalhães, não dá a sensação de uma represa sempre pronta a romper-se em fúrias, e no Congresso, ao contrário de sua atitude em Goiás, não é de arrogâncias com ninguém.
Em função das características atuais do Legislativo, preferências não mais significam votos. Daí que a opinião mais difundida, dentro e fora do Congresso, preveja a vitória do candidato em que a Presidência da República investiu suas fichas e muitas outras coisas, estas nossas e não dela. É a primeira parcela do pagamento de Fernando Henrique Cardoso pelo que Luís Eduardo Magalhães fez, desde que eleito presidente da Câmara, em favor da reeleição e em desfavor de tudo o que fosse inconveniente ao projeto fernandista. Como investigações em torno de bancos e do Proer, por exemplo.
Como tudo, na eleição senatorial de hoje, se passa entre políticos, é lógico e inevitável que, sendo o voto secreto, uma palavra predomine sobre as demais: traição. E é aí que se apresenta o único problema grandioso da política brasileira: traição, sim, ou a política seria dominada por pessoas de bem, mas traição contra quem e com que efeito, se os dois lados esperam traições tanto contrárias como favoráveis a cada um deles?
A traição é a mais instituída das instituições políticas da atualidade nacional. Sua função foi o fator decisivo, por exemplo, na aprovação do projeto de reeleição. Sem mais efeito do que este mesmo. Encabeçado pelo próprio líder do partido, Michel Temer, o PMDB votou contra a sua convenção e pronto: a traição é muito mais instituída do que a velha e outrora todo-poderosa instituição das convenções partidárias.
Na véspera de votarem a reeleição, dezenas de parlamentares peemedebistas ouviam importante consideração do senador José Sarney, ainda fazendo as vezes de ferido pelo qualificativo de traidor com que Fernando Henrique o condecorou em pessoa e com auditório. "Será uma indignidade o PMDB rever sua posição", dizia ele, concitando os correligionários a seguirem a orientação convencional de só votar a reeleição depois de 5 de fevereiro. No dia seguinte, os deputados do sempre obediente grupo sarneyista estavam todos lá, firmes, votando contra a convenção e pela reeleição. Falou-se, neste parágrafo, de ninguém menos do que o presidente do Congresso Nacional.
O que Iris Rezende e Antonio Carlos Magalhães disputam logo mais não é a presidência do Senado e, com ela, a do Congresso. O confronto é de montantes de traições ou de traidores.

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