São Paulo, sexta-feira, 7 de fevereiro de 1997
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Peça é o atual grande espetáculo da Broadway

NELSON DE SÁ
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

"O julgamento... é show business." O advogado Billy Flynn dá a dica, com voz de veludo, em número que escorre ironia, do que trata "Chicago", o grande musical da temporada na Broadway.
Nem "Rent" nem "Bring in da Noise" -é "Chicago", que estreou há dois meses, remontagem de um "clássico" de 1975, de Bob Fosse/John Kander/Fred Ebb, o espetáculo mais envolvente, mais desabridamente excitante na capital do teatro musical.
O tema ecoa, como quase tudo o que se faz hoje nos EUA, em arte ou não, o julgamento de O.J. Simpson e a crise na sociedade e nas instituições americanas.
O enredo, baseado em peça de 1926, por sua vez baseada em "fato real" da mesma época, na Chicago de Al Capone: uma corista, Roxie Hart, mata o amante e contrata um advogado, Billy Flynn, que transforma o julgamento em evento de mídia -e faz dela uma grande estrela.
Praticamente sem cenário, à frente de uma onda de musicais sem maiores efeitos especiais (o que já levou "Lord" Andrew Lloyd Weber, de "Phantom of the Opera" e "Cats", a decretar o fim dos musicais faraônicos), "Chicago" concentra-se nos intérpretes e na sensualidade ou comicidade que podem alcançar.
Não é pouca sensualidade. Ann Reinking (que faz Roxie e criou a coreografia) e Bebe Newirth (a adversária e também assassina Velma Kelly) competem em sedução.
Com figurinos em negro, pernas como as de Cláudia Raia, braços longos, das protagonistas e do coro de assassinas, é um espetáculo femininamente agressivo.
A coreografia de Ann Reinking é, como seria de esperar da ex-mulher e protagonista de meia dúzia de musicais de Bob Fosse, um reflexo do trabalho dele.
Com cadeiras e um interminável cruzar de pernas, lembra um striptease, supostamente devido à juventude de Fosse nos bares do gênero, em Chicago. Uma sensualidade de cabaré, que não poderia ter mais efeito -até inesperadamente- no presente.
O humor surge na dança de Bebe Neuwirth, acrobática e com um personagem comicamente rancoroso, mas sobretudo na hipocrisia, na desfaçatez, na elegante cara-de-pau de James Naughton, que faz o advogado manipulador de jornalistas.
Como contraponto cândido, quase estupidamente ingênuo, à ironia do musical, surge Joel Grey, de fama mundial por "Cabaret", pelo qual ganhou um Oscar, aqui no papel do marido de Roxie. Seu ritmo é tão contrário a tudo o que acontece à sua volta, no palco, que amplia a empolgação.
Nascida de uma apresentação em recital, numa série sobre musicais clássicos em Nova York,"Chicago" não poderia ser mais despojada, quando chegou à Broadway. Nem melhor.

LEIA MAIS sobre a temporada em Nova York à pág. 4-14

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