São Paulo, sábado, 8 de fevereiro de 1997
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Berlim destaca brasileiros

AMIR LABAKI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

"Demonstrar ao mundo o renascimento do cinema brasileiro" é o objetivo do ciclo de oito filmes que acontece em Berlim a partir da próxima quinta no Fórum Internacional do Novo Cinema.
A definição é do curador da mostra, o crítico alemão Peter B. Schumann, ligado à produção latino-americana desde o final dos anos 60.
Numa entrevista via Internet, Schumann historia a relação do festival com a produção brasileira, diz como nasceu a idéia do ciclo e explica os critérios da seleção.
O curador destaca ainda os dois outros títulos latino-americanos, ambos argentinos, presentes no Fórum deste ano.
O Fórum é a principal mostra paralela e autônoma do Festival de Berlim, dedicada à produção independente e a cinematografias e diretores em ascensão. Leia a seguir trechos da entrevista.
Folha - Como surgiu a idéia da mostra?
Peter B. Schumann - O Festival de Berlim tem uma larga tradição com o Brasil. Começou em 1966, quando organizei a primeira retrospectiva de cinema brasileiro, chamado naquele momento cinema novo. Foi a primeira retrospectiva de Berlim dedicada a um cinema atual, isto é, foi a primeira "perspectiva" e, até certo ponto, foi um germe do Fórum.
Um ano depois criamos a Semana do Novo Cinema no festival, cuja última edição foi dirigida por mim em 1970 e dedicada aos latino-americanos. Um ano depois converteram a semana no Fórum Internacional do Novo Cinema.
Desde o início, o Fórum dedicou-se não somente ao novo cinema latino-americano, mas também ao cinema brasileiro como uma das mais expressões mais criativas.
Fizemos duas mostras paralelas, em 1980 e 1985, para exibir novas tendências e novos talentos. Alguns títulos: "Braços Cruzados, Máquinas Paradas", "Cabra Marcado para Morrer", "A Idade da Terra", "Limite", "Ganga Bruta", "Na Boca da Noite", "Terra dos Índios", "Tudo Bem", "Chuvas de Verão", "Memórias do Cárcere" etc.
Nos anos 90 o cinema brasileiro sofreu o golpe escandaloso deste "pistoleiro governante" chamado Collor de Mello. Não foi possível, assim, mostrar algo nos primeiros anos da década.
Por isso queremos aproveitar o primeiro "boom" de produtividade para demonstrar ao nosso mundo o renascimento do cinema brasileiro e canalizá-lo em nosso mercado.
Recebemos todo o apoio possível por meio da Riofilme, Cima, Funarte e Ministério das Relações Exteriores. O pacote de oito filmes vai circular depois por cidades como Munique, Hamburgo, Zurique e Friburgo.
Folha - Quais foram seus critérios de seleção?
Schumann - Tratamos de tentar um panorama de estilos muito distintos e talentos muito diversos, de representantes da geração dos anos 60/70, que sofreu muito com o golpe de Collor, como (João) Batista (de Andrade), até novos talentos como Tata Amaral, Bia Lessa (que veio do teatro) ou José Araújo.
Filmes com estilos sempre originais, de uma tendência mais opulenta ("Carlota Joaquina") até o cinema pobre ("Crede-Mi"), do mais tradicional ("Como Nascem os Anjos") até um de pesquisa estética ("Sertão das Memórias", "Crede-Mi"), de distintas expressões do cinema político ("O Cego Que Gritava Luz", "Doces Poderes") até o cinema histórico-político ("Yndio do Brasil") e um cinema radical-feminista ("Um Céu de Estrelas"). Um panorama realmente amplo, exemplo da criatividade cinematográfica e cultural do Brasil.
Folha - Por que ficaram de fora os vencedores dos principais festivais brasileiros, "Quem Matou Pixote?" (Gramado) e "Baile Perfurmado" (Brasília)?
Schumann - Não quero falar de filmes que não selecionei.
Folha - Apenas duas outras produções latino-americanas estão no Fórum. Fale delas.
Schumann - Esses filmes refletem um outro cinema da América Latina. São produções totalmente independentes dos sistemas de fomento cinematográfico.
"Moebius" é um trabalho coletivo da Universidade de Cinema de Buenos Aires, a maior escola de cinema privada da América Latina, um filme de estreantes.
Seus jovens autores não contam nenhuma história, apenas trabalham um dogma científico do físico alemão Moebius, uma relação entre espaço e tempo em seu ponto médio, para condensá-la numa parábola inverossímil e perfeita sobre a possibilidade de manipular a mente humana.
"Picado Fino", o primeiro longa-metragem de Esteban Sapir, em preto-e-branco, é a descrição de um jovem desesperado de 18 anos que busca seu lugar na sociedade argentina.
Um filme marginal sobre a marginalidade argentina, que supera a penúria financeira para transformá-la em virtude de inusual estética de imagens. São dois filmes que saem do esquematismo estético do cinema latino-americano.

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