São Paulo, domingo, 23 de fevereiro de 1997
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BM&F, novo alvo do BC

CELSO PINTO

O escândalo dos precatórios deverá ter um novo desdobramento. O Banco Central reuniu munição contra um esquema de geração de prejuízos fictícios, por razões fiscais, na Bolsa de Mercadoria e de Futuros (BM&F). Várias corretoras pilhadas são as mesmas envolvidas no esquema dos títulos estaduais e municipais.
A essência da falcatrua com os títulos estaduais e municipais é uma cadeia de operações. Na colocação inicial, os governos tomam um prejuízo que vai virando lucro para várias instituições, nas sucessivas revendas dos papéis. Em alguns casos, na ponta final existe outro prejuízo, de um fundo de pensão.
Até aí, o BC já tem farto material. A segunda etapa do roubo está em como realizar esse lucro sem pagar impostos e liberando dinheiro para pagar os subornos que, diz a lógica, envolveram as duas pontas onde existiu prejuízo.
Neste pedaço da história já existem evidências em duas direções. Uma delas é a lavagem de dinheiro na BM&F.
O esquema é simples. Uma corretora, por exemplo, faz um contrato de opção com alguém, com uma cláusula tão absurda que fica claro que ela jamais será exercida. A corretora gera um prejuízo, que viabiliza o não pagamento de imposto sobre o lucro anterior. Quem está na outra ponta embolsa o dinheiro e o distribui entre os subornos e os participantes do esquema.
Para não despertar suspeitas, algumas pequenas corretoras apresentavam números consolidados ao BC, disfarçando as enormes receitas em algumas operações.
O BC já identificou várias operações desse tipo e constatou que várias delas foram feitas pelas mesmas instituições envolvidas na falcatrua dos precatórios. A rigor, contudo, operações desse tipo servem para qualquer forma de sonegação fiscal.
Não há indícios que a BM&F esteja diretamente envolvida na história. Na verdade, o fato de as regras da BM&F exigirem a identificação não só dos intermediários, mas também dos clientes finais, ajuda a rastrear qualquer operação suspeita.
A outra ponta é a remessa para o Exterior, através das contas CC-5 (contas de não-residentes). O BC já identificou cadeias de pagamento geradas no esquema dos precatórios que foram parar em CC-5. Dois bancos que operam em Foz do Iguaçú aparecem como intermediários frequentes.
Na investigação da cadeia de pagamentos, o BC só pode investigar instituições financeiras. No caso de empresas ou pessoas, a apuração cabe à polícia. Se houver disposição de ir até o fim, o potencial é explosivo.
Alternativas ao STF
O aumento de 28,86% para o grupo de 11 funcionários públicos, decidido pelo Supremo, é grave, mas não é um beco sem saída. A primeira resposta do governo deverá ser o recurso ao "embargo declaratório", que exigiria dos ministros o detalhamento do seu entendimento sobre o que foi decidido.
Não é apenas uma manobra protelatória. Um dos ministros entendia que não cabia o aumento de 28,86% e sim de 14%, já que, no mesmo ano em que os militares tiveram o aumento, 1993, os funcionários civis tiveram uma compensação posterior. Não está claro se o acórdão do Supremo vai mencionar esse ponto, mas a esperança do governo é que esse entendimento prevaleça na resposta ao embargo declaratório.
Outro ponto importante está ligado à natureza do processo que levou à decisão. O Supremo julgou um mandado de segurança, e alguns entendem que, nesse caso, o efeito retroativo vale para o momento da impetração do mandado e não do fato. Se for assim, o governo economizaria uns três anos de atrasados.
Mesmo que tenha que pagar todo o atrasado, o governo poderá parcelá-lo em três anos. Há precedente nesse sentido em uma decisão passada do Supremo em relação aos aposentados. Essa alternativa, contudo, pressupõe que o governo admitiria o pagamento do adicional a todos. Outra hipótese é deixar o processo correr caso a caso: o governo ganharia tempo, mas permaneceria a incerteza fiscal.
Finalmente, é óbvio que, se puder parcelar o pagamento, o governo saberá exatamente qual o impacto anual na folha e poderia compensá-lo, ao menos parcialmente, não concedendo reajustes ao funcionalismo.
Nada disso transforma em pó a decisão do Supremo, mas a torna mais palatável.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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