São Paulo, quarta-feira, 26 de fevereiro de 1997
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CPI, alhos e bugalhos

LUÍS NASSIF

O que está ocorrendo com a CPI dos Precatórios é a repetição pela enésima vez de um movimento manjadíssimo. Cria-se o clima de paroxismo, propício a linchamentos, e o que vier se traça, sem critérios maiores, sem gradações, sem checagens, sem se dar a palavra aos acusados.
Pode ser que todos sejam culpados. Pode ser que não. Daí a importância de se dar a voz a todos.
Tome-se o caso da corretora Vetor.
Alguns dias antes de a corretora ser liquidada pelo Banco Central, fui procurado por um de seus donos, Fábio Nahoun, com um apelo dramático. Estava sendo linchado, sem poder se defender. Poucos conheciam tecnicamente o mercado para separar alhos de bugalhos. E ninguém queria ouvir seus argumentos.
Ouça-se, pois, o suspeito:
"Minha corretora existe há 23 anos. Em março de 1996 o Estado de Pernambuco nos procurou querendo fazer uma operação de ARO (Antecipação de Receita Orçamentária). O Estado estava em moratória, sem conseguir pagar 13º salário. O ARO estava a taxas exorbitantes, entre 5% a 8% ao mês, mais indexador".
"Sugerimos a utilização do artigo 33 da Constituição, que permitia a emissão de títulos para pagamento de dívidas ajuizadas até a promulgação da Constituição. Eu nunca tinha feito essa operação. Mas sabia que São Paulo e Alagoas já tinham feito".
"Substituímos um ARO que custava mais de 5% ao mês por um emissão de títulos com custo de 6,22% ao ano, 7,37% com a comissão".
(Supondo indexador de 1% ao mês, ao final de 12 meses, para cada 100 de empréstimos pela ARO, o Estado teria de pagar 101 em juros. Com a nova operação, os juros em 12 meses cairiam para 21. Portanto, o Estado economizou 80% dos juros pagos anteriormente.)
"A operação em Pernambuco foi cercada de todos os cuidados. Inclusive o negociador era o presidente do Bandepe, funcionário de carreira do Banco Central e homem de ilibada reputação".
"Quando soube da operação, o governo de Santa Catarina nos procurou e pediu que fizéssemos exatamente a mesma operação. O custo de Santa Catarina foi o mais baixo do mercado, equivalente a 4,41% ao ano, mais indexador. Com a comissão, subiu para 4,99% ao ano, para o custo de ARO de 5% ao mês, repito".
"Cobramos o equivalente a 5,5% de taxa de sucesso por papéis com prazo médio de quatro anos, o que equivale a 1,34% ao ano. Nós receberíamos à medida que vendêssemos os títulos no mercado, ou seja, de acordo com a taxa de sucesso da colocação. Todo o mercado sabe o significado de taxa de sucesso. No entanto, o senador Roberto Requião, do Paraná, declarou à imprensa que a taxa de sucesso era a parte destinada ao pagamento de propinas".
"A única diferença em relação a Pernambuco foi que Santa Catarina não nos deu exclusividade para a colocação dos papéis, alegando que o Besc dispunha de 25 anos de experiência na área".
"O único problema que Santa Catarina tinha para a emissão era a inadimplência junto ao Cadin (lista de devedores federais). Mas ela pagou e regularizou a situação. Existe parecer do Tribunal de Contas do Estado que confirma a existência dos precatórios. Tudo foi feito direitinho. Deu gosto acompanhar a organização do Estado".
"No entanto, minha empresa está sendo destroçada e não consigo saber do que estou sendo acusado, para poder me defender, porque querem pegar o governador de Santa Catarina. Me acusam de coisas sem pé nem cabeça. Disseram que o pagamento do deságio era escandaloso. Quando se faz a conta na ponta do lápis, chega-se a taxas de 5% ao ano. Mas ninguém quer analisar isso".
A coluna não tem condições de dizer se ele é inocente ou culpado. Se for culpado, as provas aparecerão logo, e tudo bem. E se não for?
Rafael Greca
Ontem houve uma alteração no texto enviado pela coluna, que tirou o sentido. O que se quis dizer:
Se quiser, o ex-prefeito de Curitiba, Rafael Greca, poderá prestar depoimento fundamental para a desmontagem das ramificações da indústria do precatório existentes no Senado Federal.

Email: lnassif@uol.com.br

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