São Paulo, segunda-feira, 3 de março de 1997
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U2 confunde trip-hop com 'Tricky-rock'

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REDAÇÃO

O lançamento de um novo disco do U2, uma das bandas mais mainstream do planeta, é a perfeita oportunidade para pensar nas relações entre música e indústria. "Pop" se presta especialmente, pois é todo definido por tal tensão.
A banda talvez estivesse querendo vencer fronteiras, explorar outros territórios, mas, se o fizesse com a cara e a coragem, corria o risco de ver sua popularidade se desintegrar aos olhos do mercado.
O que fez então? Um disco em cima do muro, muito menos ousado que o anterior "Zooropa" e que nunca se decide entre os experimentos pop de vanguarda e o velho rock'n'roll de arena.
"Pop" seria, segundo os discursos, o disco de contato do U2 com gêneros como o tecno e os mantras do trip-hop, gênero de gueto que tem feito a fama de nomes como Massive Attack e Tricky.
Mas, mais que trip-hop, "Pop" é um disco de "Tricky-rock" -as batidas eletrônicas e a síncope do darling inglês trocam figurinhas -com resultado amorfo- com o velho e conhecido messianismo roqueiro de Bono e sua trupe.
Assim, mesmo nos momentos inspirados, como no já hit "Discotheque", a tentativa de tematizar o humor "bubble gum" do pop -via disco music- tropeça nos vocais épicos, moldados no amor pelos Beatles, de Bono.
Na mesma linha, "Do You Feel Loved" parece Madonna no começo e vira um rockão messiânico orientado pela entonação épica da interpretação. Não combina.
"Mofo" começa parecida com "Rhythm is a Dancer", do Snap!, ataca zombeteiramente o rock e cede espaço a "If God Will Send His Angels", baladão melancólico que é menos Tricky que um Elvis em momento tristeza. A cafonice da composição é explorada sem humor, e algo fica fora de lugar.
Deixando de lado o tecno épico (exceção feita a "Miami", que assume o humor e o ridículo da situação), sobra a intervenção de Nellee Hooper, co-idealizador de baladas que até se poderiam dizer trip-hop, como "Wake Up Dead Man", laivo de ousadia que nem deve ofender os fãs ortodoxos.
E há "The Playboy Mansion", em que o U2 confessa que sempre foi velhusco e faz bonito só com rhythm'n'blues. O tema é de novo o pop, e a letra afirma que Michael Jackson é história -bonito de ouvir de um roqueiro. Aí, sim.

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