São Paulo, terça-feira, 11 de março de 1997
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Chirac tenta conter influência dos EUA

BETINA BERNARDES
DE PARIS

O presidente da França, Jacques Chirac, inicia hoje em Brasília uma visita de oito dias à América Latina com o fim de "vender" a França e a União Européia ao Mercosul.
"O lugar da União Européia na América Latina é mais importante do que o dos Estados Unidos. Não é interesse dos países latino-americanos se fechar em uma Nafta (área de livre comércio da América do Norte) alargada, mas sim se expandir no mundo", disse Chirac antes de viajar para o Brasil.
Sua "tournée" pela América do Sul será a maior feita por um presidente francês desde 1964, quando De Gaulle visitou a região.
Os produtos agrícolas formam um dos principais pontos de atrito nas relações Mercosul-UE. O Brasil se queixa das barreiras impostas a esses produtos. Chirac, sem ser explícito em relação à suspensão dessas barreiras, disse que o problema está ligado à "desorganização dos mercados".
Ele disse que há no mundo 4 bilhões de pessoas que comem e 1 bilhão de pessoas que não comem. "Há egoísmos na Europa, nos EUA e na própria América Latina, que tem condições de produzir a preços mais baixos. É preciso cessar os combates e organizar melhor os mercados, é preciso acabar com os egoísmos e a 'arrière-pensée' (pensamento dissimulado) norte-americana de querer dirigir tudo", afirmou.
Equilíbrio
O presidente, que vê na aproximação com o mercado latino-americano uma forma de equilibrar a influência dos EUA, lembrou que a UE (União Européia) é o primeiro parceiro comercial do Mercosul, recebendo 25% das exportações dos países que o formam, enquanto para o Nafta vão 17%.
Em termos de investimentos, salientou que a França é o primeiro investidor na Argentina e o segundo no Brasil. A UE é também o primeiro doador de ajuda pública ao desenvolvimento à América Latina, somando 61% dos recursos. Os EUA, disse Chirac, aparecem em terceiro lugar, com 14%.
"A França foi o motor da ligação entre o Mercosul e a UE. Queremos aprofundar esse relacionamento. A construção européia é uma prioridade para a França e durante muito tempo não fizemos esforços em direção à América Latina e a Ásia. Isso foi sem dúvida um erro que quis apagar a partir da minha eleição", disse.
Ele compara essa política à reaproximação de uma grande família. "Nós somos nações latinas e não negamos essa ligação. A França marcou a América Latina pela sua história. Quando irmãos se separam e a família se une de novo, há sempre o amor. Com América Latina, é o retorno da família."
Chirac afirmou que o Mercosul é a região emergente para o crescimento econômico mais forte do mundo depois da Ásia, e uma das regiões mais atraentes do globo, com um PNB superior ao da Rússia e ao do sudeste asiático.
Já a França é o quarto exportador mundial em termos gerais, segundo em serviços e primeiro em produtos agrícolas.
Chirac afirmou que a diplomacia francesa durante muito tempo não deu prioridade à economia, se concentrando mais em questões políticas, ao contrário dos EUA, Reino Unido e Alemanha, que privilegiam a diplomacia comercial.
"A diplomacia norte-americana é comercial e chega a ser agressiva. Eu não quero agredir ninguém, mas também não quero ser esquecido. Não tenho complexo de defender o mercado e as empresas francesas e sublinhar as vantagens que pode representar a França. É um papel que pretendo ampliar."
ONU
Se Chirac é explícito ao defender o aumento de trocas comerciais com o Brasil, não faz o mesmo em relação ao apoio à entrada do país no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas.
"A França é favorável à reforma das Nações Unidas e à ampliação do Conselho de Segurança para a Alemanha, Japão e dois ou três países importantes do sul", disse, sem citar quais seriam esses países.
Ao falar sobre a Guiana Francesa, Chirac aproveitou para dar uma outra "alfinetada" nos EUA. Perguntado sobre os temores norte-americanos em relação à instalação de foguetes na base de Kourou, Chirac foi enfático.
"A Guiana é francesa. Eu não digo onde os norte-americanos devem colocar seus foguetes, se é na Califórnia ou na Filadélfia. É algo só do meu interesse onde vou colocar meus foguetes."
O presidente disse que a maior fronteira da França com um país é com o Brasil, na Guiana, onde ele vê "pequenos problemas".

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