São Paulo, segunda-feira, 17 de março de 1997
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Varredor de rua fala grego e já viajou pela América Latina

MARCELO OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

São Paulo conta com um varredor de rua muito especial, que fala grego, já viajou pela América Latina, gerenciou lojas e quase taxiou (manobrou) um avião. O nome dele é Jucemar Martins, 33.
Ele nasceu em Laguna (SC) e vive no albergue Pedroso. Martins trabalha na Vega-Sopave e varre ruas no centro da cidade.
Foi o seu próprio desejo de conhecer o mundo, aliado a um extinto de "não criar raiz em lugar nenhum" que o fez "cair" em São Paulo, onde ficou "encalhado por mais de cinco anos", sem emprego fixo, pulando entre pensões, albergues e alojamentos.
Aos 14, ainda em Laguna, onde até hoje vive sua família, Martins começou a trabalhar e largou o curso técnico em administração.
Sua vida começou a mudar em 82. Ao completar 18 anos, deixou Laguna. Com a mãe Janice a tiracolo, foi para Itajaí (SC). "Quando cismo, vou e pronto."
Trazido de volta a Laguna, "quase à força", pelo pai Evaristo, reencontrou o grego Efistatis Georgis Anastasiadis, para quem trabalhou na adolescência.
Durante um ano, Martins gerenciou a videolocadora de Anastasiadis. Um belo dia o comichão bateu, e avisou: "Vou para o Rio Grande do Sul amanhã".
No Estado vizinho, se associou ao dono de uma loja de jogos eletrônicos, mas disse que foi trapaceado e saiu do negócio.
Martins retornou para Laguna, reencontrou Anastasiadis e começou a estudar grego. "Falo e leio alguma coisa até hoje."
Para a Folha, ele disse algumas palavras em grego, frases e um poema infantil da tradição oral helênica. O poema foi reconhecido pela professora grega Helene Ikonomoupulo, 35, que leciona grego moderno na USP.
Ela ouviu a gravação da reportagem. Segundo Helene, Martins comete "uns erros de gramática, mas tem uma pronúncia correta".
Martins disse que gostaria de voltar a estudar a língua. Helene afirmou que ele poderá, se quiser, participar como ouvinte das aulas que ministra na USP.
Depois de passar um ano estudando grego, Martins começou seu passeio pela América do Sul. A tour começou por volta de 86 e só terminou em 89. "Estava em Porto Alegre, vi um ônibus de excursão que ía para a Argentina, e entrei. Larguei no meio a excursão e fiquei um mês como camelô em Buenos Aires." Depois foi para o Chile, Paraguai e Peru.
Martins chegou em São Paulo em 92. "Fui roubado e só deixaram os documentos".
Após quatro anos em empregos diversos, foi trabalhar como faxineiro no aeroporto de Cumbica, onde foi demitido após descobrirem que ele havia manuseado os controles de uma aeronave.

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