São Paulo, sexta-feira, 21 de março de 1997
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O enigma do crescimento

CELSO PINTO

No final do ano passado, a principal dúvida do mercado financeiro era se a economia estava caminhando para um desaquecimento natural ou não. Hoje, a maioria projeta um crescimento de 4% a 5% do PIB para este ano e a pergunta é outra: dá para crescer tudo isso sem gerar um déficit comercial alto demais?
Bem, essa é a regra, mas existe pelo menos uma exceção a considerar. O economista Paulo Mallann, diretor-financeiro do Bicbanco, continua apostando, quase sozinho, que a economia neste ano vai crescer apenas de 2,8% a 3,3%, sem que seja preciso aplicar qualquer freio artificial.
A projeção de Mallmann está apoiada num exercício que ele fez usando o Imec, um índice apurado pela Fipe de São Paulo, que procura captar tendências de crescimento na economia a partir de vários indicadores. O Imec tem suas precariedades, mas Mallmann encontrou uma forte correlação entre a sua variação e a do produto (PIB) efetivamente medido, entre 1993 e 1996. Ou seja, o que o Imec indicava que aconteceria, aconteceu.
O Imec, no primeiro bimestre deste ano, cresceu 8,9%. Considerando a correlação encontrada, essa expansão equivaleria a um aumento do PIB de 5,5% no primeiro trimestre.
Parece muito, mas é puro efeito estatístico. Como no início do ano passado o PIB estava desacelerado, os 5,5% refletem uma base muito baixa de comparação. Limpando este efeito e projetando para o resto do ano, se chegaria a um crescimento entre 2,8% e 3,3%, muito parecido ao do ano passado.
A seu favor, Mallmann argumenta que também no ano passado ele apostou em 3% e o PIB fechou em 2,9%. Ele reforça o diagnóstico com outros argumentos.
Neste ano, a chance de crescimento acima da média estaria com a linha branca (fogão, geladeira etc.), principalmente pela extensão do prazo de financiamento, o que reduz a prestação necessária para compra de bens mais caros. O setor de carne também está indo bem. Em compensação, eletroeletrônicos, calçados, vestuário não vão bem.
De onde poderia vir o impulso para o crescimento? O consumo representa 65% do PIB e crescerá moderadamente este ano: a massa salarial estabilizou-se, o desemprego tenderia a crescer. O consumo do governo também cairia, porque o déficit seria menor. O crescimento do déficit do setor externo seria menor do que o do ano passado. Os investimentos estão crescendo, mas como eles respondem por apenas 20% do PIB, o impacto é relativo.
São afirmações sujeitas a enormes controvérsias entre outros analistas no mercado. Um grande banco, por exemplo, lembra que se a economia neste ano não crescer absolutamente nada em relação ao ano passado, ainda assim, por efeito estatístico, o PIB já cresceria 2,4%.
No último trimestre do ano passado, o PIB cresceu apenas 0,77% em relação ao trimestre anterior. Se, em média, a economia neste ano mantiver esse mesmo ritmo modesto de expansão média registrada no último trimestre do ano passado, a economia cresceria 4,2%.
Esse mesmo banco procurou encontrar a tendência de dez indicadores de atividade neste início de ano: embalagens, faturamento real do comércio, Fiesp, IBGE (indústria), Imec, consumo de energia e combustível, Serviço de Proteção ao Crédito, Telecheque e índice de rendimento real por pessoa ocupada. Em todos eles, obteve-se uma linha apontando para um crescimento. Suave, mas caminhando para algo em torno de 4,5% neste ano.
O governo, aparentemente, ainda não fez um diagnóstico definitivo.
Déficit sobe mais
A balança comercial de março, nesta terça-feira, já acumulava um déficit de US$ 637 milhões, fruto de exportações de US$ 2,142 bilhões e importações de US$ 2,779 bilhões. Como ainda faltavam sete dias úteis em março, fica reforçada a projeção de um déficit de US$ 800 milhões a US$ 1 bilhão no mês.
Pior ainda é a indicação de que há US$ 416 milhões em importações desembarcadas nos portos mas ainda não desembaraçadas na alfândega. Quem entende diz que este nível é de duas a três superior ao normal, o que indica que as importações continuam vigorosas.

E-mail: CelPinto@oul.com.br

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