São Paulo, sexta-feira, 21 de março de 1997
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70% das crianças que trabalham repetem

LUCIANA BENATTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os baixos salários dos pais, a ausência de uma política educacional de tempo integral, a deterioração das relações de trabalho e a importância atribuída ao serviço pela sociedade são alguns fatores que levam ao trabalho infantil no país.
As conclusões constam da pesquisa "O Trabalho Tolerado de Crianças de até 14 anos em Seis Capitais Brasileiras", do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos), divulgada ontem em São Paulo.
O estudo, feito a pedido da CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação) com apoio da OIT (Organização Internacional do Trabalho), foi o primeiro estudo realizado no Brasil para verificar que consequências esse o trabalho traz à criança.
"Ao contrário do trabalho em carvoarias e no corte de cana, que a sociedade naturalmente rejeita, o trabalho infantil urbano é tolerado pela sociedade", diz a socióloga Suzanna Sochaczewski, técnica do Dieese que coordenou a pesquisa.
Segundo ela, a valorização excessiva do trabalho como solução para os problemas sociais faz com que as pessoas achem que o trabalho é bom até para as crianças.
"Ao ver uma criança entregando pizza as pessoas ficam aliviadas. Acham que é melhor ela estar trabalhando do que no sinal assaltando ou cheirando cola", diz.
Para João Carlos Alexim, diretor da OIT no Brasil, a pesquisa comprova que o trabalho urbano também é prejudicial à criança. "O desemprego favorece a exploração infantil. Só com desenvolvimento tecnológico e social é possível erradicar o trabalho infantil", diz.
Dados oficiais indicam que existem no Brasil cerca de 5 milhões de crianças entre 5 e 14 anos exercendo algum tipo de trabalho.
Entre as crianças pesquisadas, mais de 70% não tinham completado 14 anos, sendo que um terço do total começou a trabalhar antes dos 10 anos de idade. Para crianças com menos de 14 anos o trabalho é proibido por lei no país.
Como consequência do serviço, os índices de repetência entre essas crianças são elevados, ficando entre 60% e 70%.
Os resultados da pesquisa revelam que mais de 90% das crianças gostam de trabalhar. O principal motivo é que com seu salário elas ajudam a família.
"Por causa dos baixos salários, como estratégia de sobrevivência, as famílias vão colocando cada vez mais pessoas no mercado de trabalho", explica a socióloga.
Segundo a pesquisa, a maioria dessas crianças não tira férias e exerce funções pouco qualificadas.
O estudo foi realizado em 95 e 96 com crianças que estudam e trabalham nas cidades de Belém, Recife, Goiânia, Belo Horizonte, São Paulo e Porto Alegre.

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