São Paulo, sexta-feira, 21 de março de 1997
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Túlio está mudando e pode deixar de ser Túlio

MAURICIO STYCER
DA REPORTAGEM LOCAL

O "caso Túlio" já foi bastante examinado pelos colunistas deste jornal, mas julgo que posso acrescentar algo -uma visão botafoguense do caso.
Já há corintianos sonhando com o dia em que Túlio fará as malas e voltará para seu apartamento na Barra da Tijuca.
Há no ar um clima de profunda decepção com o desempenho do artilheiro goiano, alimentado pelos sucessivos maus resultados do time.
A decepção está diretamente relacionada a uma falsa expectativa -e vai ser muito difícil reverter esse quadro.
Túlio chegou ao Corinthians com as credenciais de grande goleador, três vezes artilheiro do Campeonato Brasileiro e ídolo de um Botafogo que há anos não tinha um ídolo.
Túlio está jogando no Corinthians exatamente como jogava no Botafogo: parado na frente, rondando a área lentamente, como quem não quer nada, fingindo-se de morto e, volta e meia, mandando a bola para dentro do gol.
Túlio nunca foi de se movimentar muito em campo, não tem arranque, não gosta de cabecear e não sabe marcar os seus adversários.
Com frequência, no Botafogo, passava várias partidas seguidas sem fazer gol.
Às vezes, desencantava e marcava três ou quatro gols numa única partida -exatamente como fez, no último fim-de-semana, na vitória sobre o São José por 6 a 2.
Uma diferença fundamental entre o Túlio do Botafogo e o Túlio do Corinthians é que a torcida botafoguense não alimentava em relação ao seu time um décimo da expectativa que a torcida corintiana alimenta em relação ao Timão.
O foco da mídia sobre o Botafogo também não se compara ao que há sobre o Corinthians. Qualquer partida do Corinthians é transmitida pela TV, acompanhada por um batalhão de repórteres e assistida por milhares de torcedores.
No Rio, Túlio passava quatro jogos sem marcar e quase ninguém notava. Se jogasse pelo Flamengo, talvez, tivesse os mesmos problemas de agora.
No Botafogo, um time que até ser campeão brasileiro em 1995 sofria de um certo complexo de inferioridade, a pressão era infinitamente menor. Túlio não marcava em três partidas, mas fazia três gols contra o Olaria, disparava na artilharia do campeonato e deixava todo mundo feliz.
Com sua vocação para o show business, Túlio é uma espécie de Xuxa do futebol. É meio desengonçado, tem um sorriso bobo e adora fazer palhaçadas. As crianças adoram -e quando as crianças adoram, os pais tendem a, mesmo não gostando, suportar. Que o diga o seu patrocinador.
O sucesso de Túlio no Rio se deve também ao seu enorme senso de autopromoção, que combina bem com a cidade onde se consagrou. São Paulo, uma cidade mais "séria", parece preferir jogadores mais "caretas", como Marcelinho.
Túlio está tentando se adaptar a São Paulo. Está treinando e, até, se submeteu a testes físicos. No último domingo, pela primeira vez, comemorou seus gols com os colegas e evitou correr em direção à câmera de TV, como sempre faz.
Para sobreviver em São Paulo, Túlio está mudando. Se mudar muito, pode ser que -e é aí que mora o perigo- deixe de ser o Túlio no qual estão investindo tantos milhões.

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