São Paulo, sexta-feira, 21 de março de 1997
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Manipulação é a arma de Minghella

HARRIET LANE
DO "THE OBSERVER"

Em uma suíte no hotel Dorchester, usando uma camisa laranja flamejante sob a jaqueta de couro fechada até o pescoço, Anthony Minghella é mais cordial e articulado do que se poderia esperar. Especialmente quando se têm em mente as 12 indicações para o Oscar, incluindo a de melhor diretor.
Baseado no romance de amor, guerra e traição de Michael Ondaatje, o roteiro de Minghella foi discutido não apenas com o badalado produtor norte-americano Saul Zaentz, mas também com o autor, em pessoa.
Em lugar de banir Ondaatje, os realizadores do filme aproximaram-no do processo de produção do roteiro.
"O livro era cheio de imagens formidáveis, mas essas imagens tinham uma ligação tênue com a narrativa. Senti que, a menos que me libertasse do livro, seria prisioneiro de seu ritmo e de sua poesia. O objetivo primordial de um filme como esse é embarcar o público em uma viagem, ao passo que o livro evita chegar a um destino."
Filmado na Tunísia, em Veneza e na Toscana, o filme exibe atores excelentes ("Não são estrelas de cinema", enfatiza Minghella. "Este filme só tem atores.") como Ralph Fiennes, Kristin Scott Thomas e Juliette Binoche.
No documentário sobre a filmagem produzido por uma equipe canadense, o que se vê é um Minghella integralmente dedicado a cada membro do elenco: dá conselhos, tapinhas nas costas, orienta, festeja como a mais dedicada das professoras de uma escola maternal. De vez em quando, suspeita-se, Minghella deve ter achado tudo um pouco falso.
"Ser ator", explica Minghella, sempre um perfeito cavalheiro, "é ser um convidado indesejável em uma festa. No meio da festa, o ator é chamado a fazer certa mágica, depois é mandado para fora de novo. É, eu tenho paciência com os atores e tenho respeito pelos atores. E, evidente, em grande parte a minha compaixão serve a mim mesmo. Não sou ali nem psiquiatra nem padre: estou ali para fazer um filme bom. Funciono do mesmo jeito com o diretor de fotografia e com o Ralph. Quero tirar deles alguma coisa."
Isso não passou despercebido ao elenco: Scott Thomas, notória fã do diretor, disse dele que era discretamente manipulador; Fiennes, que tinha "uma mão de ferro na luva de veludo".
Sobre seus atores, Minghella diz: "Juliette é transparente, é tão concentrada. Kristin não é transparente. Uma das coisas que a câmera celebra é o fato de ela ser tão cheia de segredos".
"Ela e Ralph, nesse sentido, têm dinâmicas praticamente idênticas. Entre eles havia uma química: um deixava o outro mais relaxado do que eu jamais conseguiria. São criaturas tão parecidas: membros longilíneos, refinados, irritadiços, puros-sangues inquietos."
Nascido em 1954 na ilha de Wight, de pai e mãe italianos, Minghella estudou teatro em Hull.
Algumas de suas peças chegaram ao West End, foram premiadas, e em 1990 ele roteirizou e dirigiu seu primeiro filme, "Truly, Madly, Deeply". Em 1993, Minghella seguiu para os EUA para dirigir "Mr. Wonderful".
"O que aprendi é com que rapidez você pode perder o rumo quando há tantas mãos generosas querendo ajudar", diz ele, piscando. "Entendi que, se quisesse continuar a fazer filmes, teria de fazê-los do meu jeito."

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