São Paulo, sábado, 22 de março de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A recessão inevitável

É correta a previsão de 5% de crescimento do PIB em 1997?

JOSÉ MACHADO

O Brasil não tem condições de crescer 5% este ano porque, embriagado pelos encantos do mercado, o governo não adota uma política de desenvolvimento a longo prazo e porque um dos efeitos dessa renúncia ao planejamento é a grave crise em nossas contas externas.
A falta de uma política de longo prazo, que articule o mercado interno com o externo e as prioridades para a economia, em termos de investimentos, exportações e importações e dívida pública, leva o país a viver ao sabor dos interesses dos investidores, frequentemente especuladores externos.
Mas, apesar de todo o esforço do governo no sentido de uma abertura indiscriminada da economia, de privatizações de setores estratégicos, da renúncia ao dever da fiscalização sobre o sistema financeiro -revelada brutalmente pela CPI dos Precatórios-, da retirada de direitos dos trabalhadores e dos cidadãos, o capital produtivo ainda não deu o ar de sua graça no volume desejado.
O que frequenta nossas bolsas, com grande desenvoltura, é o chamado capital volátil, em busca de lucros fáceis, proporcionados por taxas pornográficas de juros.
Como os investimentos produtivos não chegam nas proporções desejadas, a economia tende à estagnação ou a um crescimento reduzido. Esses investimentos não vêm porque os investidores sabem que a política de câmbio supervalorizado, que provoca um déficit crescente na balança, é insustentável a longo prazo. Em semelhante situação, os investidores se retraem e cedem espaço aos especuladores.
É essa situação que levará o próprio governo a não incentivar o crescimento da economia a taxas de 5%, porque isso acarretaria um aumento das importações para sustentar o nível de investimentos, o que provocaria um aumento ainda maior do déficit comercial e ampliaria as necessidades de financiamento da balança de pagamentos por meio de novos capitais especulativos.
Isso significa que o governo está em xeque perpétuo, à espera de que se opere alguma mágica prevista na mitologia neoclássica.
As alternativas não são muitas. O governo perseguiu com tanta insistência certas miragens do fundamentalismo de mercado que hoje, fora opções de total renúncia à soberania nacional, restariam apenas as seguintes: a) desvalorização do câmbio para tornar as exportações competitivas, com risco de volta da inflação; b) redução deliberada do ritmo do crescimento, para conter as importações, provocando aumento do desemprego.
Como está padecendo de uma espécie de fanatismo neoliberal, o governo, inclusive para não negar seus dogmas, não adotará a primeira alternativa. Optará pela redução deliberada do ritmo do crescimento econômico, enquanto espera por um milagre e tenta fugir de um fantasma que o atormenta. O fantasma de uma bancarrota mexicana.

Texto Anterior: Compromisso da Semana Santa
Próximo Texto: O Brasil de santa Edwiges
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.