São Paulo, sábado, 29 de março de 1997 |
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Eliot Weinberger faz crítica sem a poluição do jargão pseudotécnico
NELSON ASCHER
Nesse quadro, Eliot Weinberger é uma autêntica raridade, na medida em que não pertence ao mundo das universidades (não chegou, aliás, a concluir nenhuma) nem é um "reviewer" (resenhista). Mais raro ainda -enquanto os universitários se dedicam a resolver (no papel, naturalmente) os problemas do mundo e os jornalistas literários detêm-se na ficção- é o fato de que ele discorra sobre questões propriamente (mas não só) literárias e, entre estas, prefira as relacionadas à poesia contemporânea. A poesia está no centro de seus interesses sob uma forma peculiar: a da tradução. Weiberger é atualmente o principal tradutor de poesia hispano-americana em seu país. Sua obra máxima nesse campo é a tradução da poesia reunida do mexicano Octavio Paz. Seu "tour de force" tradutório, no entanto, é a versão inglesa da epopéia moderna do chileno Vicente Huidobro: "Altazor". Além disto, ele verteu outros poetas mexicanos, Xavier Vilaurrutia e Homero Aridjis, a prosa dos argentinos Jorge Luis Borges e Julio Cortázar e organizou uma importante antologia de poesia norte-americana escrita dos anos 50 em diante. Ele já havia também escrito dois livros de ensaios tão anticonvencionais quanto o resto de sua carreira: "Works on Paper" (New Directions, 1986), "Outside Stories" (New Directions, 1992). A esses junta-se agora "Written Reaction (algo traduzível como "Reação por Escrito") publicado no final do ano passado. Os dois primeiros compunham-se de textos onde, discorrendo sobre poetas americanos modernos (Oppen, Reznikoff, Rexroth, Langston Hughes) ou sobre Paz e Huidobro, falando sobre poesia chinesa antiga ou moderna e analisando o ambiente literário, ele desenvolvia uma prosa surpreendente que quase transformava seus textos em narrativas ficcionais sem no entanto sacrificar a especificidade dos fatos. O ápice desse estilo -confessamente aprendido com gente como Artaud e Borges- foi atingido em peças que, difíceis de definir, abordam massacres do Khmer Vermelho, o papel literário dos tigres e aquilo que as holotúrias (os pepinos-do-mar) estariam sonhando. Já "Written Reaction" reúne textos geralmente mais breves, sobretudo observações, intervenções polêmicas e notas de leitura. Mas, seja discutindo questões de tradução e a trajetória de Mircea Eliade, seja chamando a atenção para Nathaniel Tarn, Jerome Rothenberg, Hugh MacDiarmid e Kamau Brathwaite ou polemizando com a "Language Poetry", seu estilo continua exato, penetrante e isso, em particular, quando aborda autores de que não gosta, como o poeta "yuppie" Frederick Seidl ou o ecológico-místico Robert Bly. Ele chega a extremos de crueldade, por exemplo, quando define o que este último escreve: "Os poemas de Bly são uma floresta de pontos de exclamação através da qual a frase 'Eu amo' corre como o fugitivo de um hospício". O melhor, porém, deste seu livro -bem como dos dois anteriores- é sua legibilidade. Sua prosa, ao contrário daquela que os críticos profissionais parecem apreciar, está inteiramente livre de todo jargão pseudotécnico e pseudocientífico que polui hoje em dia o campo das Letras. Seus textos são uma demonstração clara de que pode existir uma crítica de verdade -informada e informativa- que, sem ser ostensiva e pretensiosamente literária, seja também literatura. Livro: Written Reaction - Poetics Politics Polemics Autor: Eliot Weinberger Lançamento: Marsilio Publishers (importado) Quanto: US$ 12,95 (248 págs.) Onde encontrar: Livraria Cultura (tel. 011/285-4033) Texto Anterior: O escritor Nikos Kazantzákis busca a nova face de Deus em "Ascese" Próximo Texto: Joe Lovano celebra Frank Sinatra em CD Índice |
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