São Paulo, segunda-feira, 7 de abril de 1997
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Democracia de Consumo

AURÉLIO WANDER BASTOS
Estamos evoluindo para uma democracia de consumo, onde esperamos que todos os cidadãos tenham a oportunidade de consumir os bens essenciais básicos nas mesmas condições de qualidade, de preço e segurança.
O novo regulamento do Código do Consumidor (decreto nº 2.181, de 20/3/97), que revoga o regulamento anterior (decreto nº 661, de 9/7/93), restaura a vigência substantiva do Código do consumidor e redefine os procedimentos administrativos para fiscalização, autuação, apuração e sanção das práticas infrativas à relação de consumo.
O velho regulamento, comprometido às práticas interventivas de fiscalização e apoiado em procedimentos apuratórios basicamente voltados para a apreciação administrativa de infringências individuais do código, subtraiu-lhe a vocação de defesa dos direitos coletivos, difusos e homogêneos, assim como instaurou um verdadeiro e inóspito centralismo fiscal e apuratório.
Este sistema, na forma legislativa regulamentar, incentivava um verdadeiro cipoal de recursos, que vinha transformando as políticas de proteção ao consumidor em proposições vazias, de frágeis resultados práticos.
Na verdade, o velho regulamento, voltado para modelos fechados de fiscalização, apoiados em políticas de tabelamento e monitoramento, rigidamente controlados pela União, estava dificultando a reacomodação dos órgãos federais de defesa do consumidor -DPDC/SDE, Sunab, Inmetro, DNC, etc- às novas práticas de mercado, que exigem uma fiscalização mais ágil, apoiada em modelos mais flexíveis e mais confiantes no mercado, conforme a proposta do Código do Consumidor.
O novo regulamento, agora vigente, preocupado em viabilizar o Brasil como uma democracia de consumo, criou as condições básicas para uma efetiva implantação do Sistema Brasileiro de Defesa do Consumidor (SBDC), incentivando práticas descentralizadas de fiscalização e sanção (inclusive recolhimento de multas) comprometidas com a estrutura federativa do Estado Brasileiro.
O novo regulamento dá aos órgãos municipais de proteção ao consumidor (onde efetivamente vive o cidadão), e aos órgãos estaduais, reais competências para implementar a política nacional da proteção ao consumidor definida pelo Departamento de proteção e defesa do Consumidor -DPCD/SDE, órgãos do Ministério da Justiça e seus conselhos assessores, que ficaram, também com a competência para dirimir conflitos de interesses coletivos e difusos ou de divergências entre os estados federados.
Por outro lado, a par de incentivar a proteção processual da cidadania difusa e coletiva, sem desprezar a proteção às demandas de natureza individual, este novo decreto, depois de redefinir e consolidar os dispositivos sobre práticas infrativas (com este neologismo de garantia das inovações) e cláusulas abusivas dispersas no código, amplia as oportunidades de realização dos "compromissos de ajustamento" entre o poder público e as empresas.
Assim, demonstra a confiança nas práticas de preço, segurança e qualidade de produtos (e serviços) das próprias empresas na sua movimentação de mercado.
O novo regulamento, preocupado em viabilizar condições estáveis de fornecimento de produtos (e serviços), como garantia de direitos, assim como o código admite o cadastro aberto de caráter público de devedores, permitirá, como fundamento funcional de uma democracia de consumo, a criação e implantação do cadastro de fornecedores. Especial forma de proteger o mercado das violações abusivas e garantir o reconhecimento público das empresas que buscam cotidianamente melhorar a qualidade e segurança de seus produtos (serviços), com de padrões de preços acessíveis a todos os cidadãos.
Finalmente, esse novo decreto reconhece o papel educativo e de representação das entidades civis de defesa do consumidor em juízo e administrativamente, permitindo-lhes ampliar o seu papel positivo na consolidação da ordem democrática e, muito especialmente, do projeto de construção de uma democracia de consumo no Brasil.

Aurélio Wander Bastos, 53, advogado, é secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça.

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