São Paulo, segunda-feira, 7 de abril de 1997
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A reforma gerencial da PM

LUÍS NASSIF

Na Folha, o secretário de Segurança de São Paulo, José Affonso da Silva, diz que a Polícia Militar é mero reflexo da sociedade. Se existem marginais na sociedade, também existem na polícia. Se não existissem marginais na sociedade, não existiriam na polícia. Aí, tropeça na lógica e constata o óbvio: se não existissem marginais, não haveria porque existir polícia.
O "Estado" traz matéria com vizinhos de "Rambo" -o mais violento dos policiais- que atestam sua vida "exemplar" na comunidade. Ou seja, ele era "marginal" enquanto PM, não enquanto civil.
O "Jornal da Bandeirantes" apresenta testemunha que informa que as atrocidades cometidas pelos PMs eram acompanhadas por um suboficial, que os comandava, que não participava diretamente, mas não interferia.
O "Jornal Nacional" entrevista o cabo que comandava a tropa e que se dizia impotente para segurar seus subordinados, por não conhecer seus hábitos.
Uma assembléia de subtenentes e aposentados da PM termina em discursos virulentos denunciando suposta "armação" do episódio -e revelando um grau de corporativismo inédito e preocupante, porque de uma corporação armada.
Qualquer consultor de empresas que se dedicasse a analisar a PM chegaria às seguintes conclusões:
1) Os sistemas de informação da PM são fraquíssimos, a ponto de permitir que a ação dos policiais na favela durasse várias semanas, sem ser detectada. Onde não há fluxo organizado de informações, não há comando.
2) Inexistem sistemas de seleção. Nenhuma empresa medianamente organizada é "reflexo da sociedade" -ou seja, possui em seus quadros um percentual de marginais equivalente ao da sociedade como um todo. Os departamentos de recursos humanos existem justamente para selecionar adequadamente os candidatos a emprego.
3) Não existe missão clara da PM. Se houvesse, o suboficial e o cabo saberiam como agir prontamente quando identificaram desvios de conduta de seus subordinados. E o comandante do batalhão teria tomado medidas imediatas para prender os policiais violentos. No entanto, a violência foi tratada com condescendência por uma corrente hierárquica, que ia do cabo ao comandante. É óbvio que não se pode falar de episódio isolado.
4) Como reflexo da falta de missão clara, o sistema de valores da PM é diluído, pouco perceptível. Hoje em dia as modernas empresas são consideradas como elementos de afirmação da cidadania -ao consolidar valores que, posteriormente, vão influenciar os ambientes sociais de seus funcionários. No seu ambiente social, "Rambo" comportava-se como cidadão. O lado selvagem aparecia apenas no seu ambiente profissional. Precisa mais?
Em suma, não serão apenas discursos ou um secretário de Segurança de bons princípios que resolverão essa questão da violência da PM. Há um desafio gerencial extraordinário a ser empreendido, de reestruturação total da corporação, dentro de novos valores e novos conceitos gerenciais.
Há a necessidade de um supergerente, que consiga definir um modelo, identificar os oficiais comprometidos com essa modernização, desmanchar os feudos da organização e, ao mesmo tempo, ter a necessária firmeza para impedir sublevações.
É preciso que governadores aprendam de uma vez a diferenciar o papel do intelectual da missão do executivo. A formação do intelectual não o credencia a comandar organizações, ainda mais da complexidade da PM. Eles têm função moral importante, papel relevante como conselheiros, não como executivos. Em qualquer empresa eficiente, intelectuais são, no máximo, membros do Conselho Consultivo.
Batalha de Itararé
O relator da CPI, Roberto Requião, faz dois esclarecimentos à coluna:
1) Nega que o presidente do Senado, Antônio Carlos Magalhães, tenha censurado os senadores por encontros secretos com suspeitos; e nega que os integrantes da CPI tenham censurado ACM por seu encontro com Paulo Maluf. Cada senador tem total liberdade para encontrar-se com quem quiser, diz Requião -que atribui as versões veiculadas a brigas menores entre jornalistas. "Não mudou nada nos trabalhos", diz ele. Os fatos confirmam sua declaração.
2) Nega que a CPI vá encerrar seus trabalhos com os depoimentos de banqueiros, a serem colhidos esta semana. Esclareço: têm saído algumas matérias esparsas nessa direção, que claramente fazem parte de uma operação-abafa, articulada por alguns senadores, preocupados com que os trabalhos avancem em direção à área delicada das contribuições eleitorais.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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