São Paulo, quinta-feira, 10 de abril de 1997
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Comitê eleitoral

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - É impressionante a visibilidade do governo como produtor de releases. Chamo de releases aqueles eventos havidos no Planalto em que a mídia, forçosamente, tem de comparecer para registrar o anúncio de novas intenções governamentais. Não há semana em que, num pequeno pódio, em cima de um tapete, o presidente não comunique alguma coisa que não vai acontecer e que quando acontece nada significa.
Inevitavelmente, sou obrigado a lembrar o governo JK. Ele também reunia a imprensa de seu tempo, mas sempre para dizer o que já havia feito, nunca o que pretendia fazer. A velocidade com que governava o país em várias frentes pode ter tumultuado a nossa caixa -besta negra de tecnocratas e guarda-livros que até hoje o responsabilizam pela maioria dos nossos males.
A verdade é que ele mudou o Brasil. Não foi um estadista do porte de Vargas, esse sim formulou um projeto nacional articuladamente, tarefa que FHC poderia fazer se não perdesse tempo em banalidades e picuinhas. Alegar que Vargas fez o que fez porque implantou um regime autoritário não diminui o seu valor.
O atual presidente, por meio das MPs e do colossal prestígio de sua caneta, na hora de o Congresso votar projetos que lhe interessam pessoalmente, dispõe de um poder quase igual. Certo que Vargas censurou formalmente a imprensa. FHC não tem condições (ainda) para fazer o mesmo.
Uma assessoria de marketing pode criar fatos que ocupem o noticiário. Não é difícil balancear a mídia: escândalos se sucedem, precatórios e Diadema têm direito aos 15 minutos de glória.
Nas brechas, o Planalto reúne meia dúzia de pessoas da chamada sociedade civil, cinco ministros da casa -e dá a impressão de que alguma coisa será feita.
O primeiro mandato de FHC já acabou. A sua única meta, o único dedo de sua mão, que já teve cinco, é o segundo mandato. O Planalto está mais para comitê eleitoral do que para sede de governo.

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