São Paulo, sábado, 12 de abril de 1997
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Queen e Aids rendem aplausos a Maurice Béjart

ANA FRANCISCA PONZIO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Com "Le Presbytre Ná Rien Perdu de Son Charme, Ni le Jardin de Son Éclat" ("O presbitério não perdeu seu charme, nem o jardim seu brilho"), o Béjart Ballet Lausanne recupera sua capacidade de arrebatar o público.
Ovacionado na estréia em São Paulo, na última quinta, o novo espetáculo de Maurice Béjart assinala mais um marco na carreira do coreógrafo francês, cujo elenco ainda se apresenta hoje e amanhã no Teatro Municipal.
Se, em 1959, Béjart lançava "Sagração da Primavera", que exaltava o amor selvagem como símbolo de vida, agora o coreógrafo se confronta com a Aids como negação da união sensual.
Para o coreógrafo que procurou fazer da dança uma expressão carregada de erotismo e divindade, a chegada ao tema da Aids, em "Le Presbytre...", representa o limiar de um ciclo, onde fim e renascimento se confundem.
Depois de perder vários bailarinos vítimas de Aids, inclusive sua estrela principal, Jorge Donn, o coreógrafo realiza uma espécie de exorcismo.
Livre de cobranças, Béjart parece ter deixado glórias e fracassos para trás. Suas raízes eruditas e literárias, cultivadas quase como uma condição francesa, dão licença ao pop em "Le Presbytre...".
Em vez de citações poéticas de Mallarmé ou Baudelaire, o coreógrafo cai nos braços da "baixa cultura", sugerindo que, afinal, o inferno da Aids não explodiu em meio a tertúlias.
Daí, por que não aproximar o balé de um show de rock, embalado pelas músicas do grupo Queen? Em seu "aqui-agora", "Le Presbytre..." soa como um grito de guerra, que instiga uma luta a ser vencida.
Neste espetáculo em homenagem a Jorge Donn, Freddie Mercury e todas as pessoas que morrem jovens, Béjart estabelece um marco em sua carreira mais pela via humanista do que pela inovação estética.
Quem for ao espetáculo em busca de obra-prima ou disposto a checar se ali constam os ingredientes contemporâneos da inovação, sairá decepcionado. Acima de tudo, "Le Presbytre..." contém uma história de vida.
Em várias cenas é possível vislumbrar referências a antigos balés de Béjart. Algumas encerram antíteses. Como o rapaz que realiza uma dança de contrações dentro de um quadrado aprisionante -enquanto décadas atrás, em "Bolero", Donn dançava sobre uma base redonda, com amplidão gestual e espacial.
Apesar de excessos como as imagens de Donn projetadas em tela gigante, "Le Presbytre..." instala o clima de ritual comum perseguido por Béjart que, como feiticeiro experiente, sabe envolver o público.

Espetáculo: Béjart Ballet Lausanne
Onde: Teatro Municipal (pça. Ramos de Azevedo, s/nº, tel. 222-8698)
Quando: hoje, às 20h30, e amanhã, às 17h
Quanto: R$ 20 a R$ 120

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