São Paulo, quarta-feira, 16 de abril de 1997
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De terno novo, cartola ainda anda em círculos

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Troca-se o padrão da gravata, o corte do terno, a linha do colarinho, mas o cartola brasileiro segue andando em círculos.
Pegue-se como exemplo as recentes quedas dos treinadores do São Paulo e do Flamengo. Muricy e Júnior são duas pratas da casa, dois ex-craques de história diferente, mas igualmente de brilho singular.
Muricy foi, seguramente, a maior esperança branca do nosso futebol. Menino ainda, no Dente-de-Leite da extinta TV Tupi, a cada manhã de domingo, esculpia no campo pequenas obras-primas, dignas da assinatura de um Pelé. Se aos 10, 11 anos, jogava tudo aquilo, como seria aos 20? Aos 20, já não era tanto, mas o suficiente para encantar quem gostasse do futebol.
Um joelho estourado, a recuperação precipitada, e eis a esperança se transformando muito cedo em decepção.
Muricy volta à cena já com a barriguinha saliente de um autêntico craque de casados e solteiros, como auxiliar de Telê. Constrói um time de juniores devastador, que irá abastecer de pé-de-obra barato e qualificado o esquadrão que o mestre montava em cima para ser bicampeão do mundo.
Quando chamado a substituir Telê, na curva descendente do time campeão, fêz-se ele mesmo um campeão. Até que o time caísse abaixo do nível do mar, e Telê fosse obrigado a voltar às montanhas de Minas. Muricy, então, embicou a equipe para vôos mais altos. Mas a decolagem foi abortada pela vinda intempestiva de Parreira. Novo desastre, nova emergência.
O resto da história é recente demais para ser relembrada.
Caiu, porém, de fronte erguida. Ao contrário dos que o derrubaram, que, se fronte possuem, por trás dela move-se apenas um jogo desconexo de sombras.
*
Sobre Júnior, basta repetir a frase de Newton Santos, a Enciclopédia: "Ele foi elhor do que eu". Como jogador, teve todas as glórias, menos a de ter levantado uma Copa do Mundo. Como treinador, só decepções. À distância, não dá para avaliar a capacidade de Júnior nessa nova função. Mas dá pra ver com clareza que o problema desse Flamengo estelar, promessa nunca cumprida, não está no banco à beira do gramado. Por ali já passaram cinco técnicos em dois anos; dentre eles, o supercampeão carioca Joel Santana e o badaladíssimo Luxemburgo, novamente cobiçado pelo Fla.
O problema, claro, lá como cá, está na poltrona onde se afunda o cartola de plantão, o despreparado pela própria natureza.
Tanto, que esse mesmo São Paulo andou batendo cabeça para escolher um diretor de futebol remunerado que atendesse às necessidades das novas formas de gerência, exigência dos tempos atuais. Assim como o banco Excel, na busca de alguém do ramo para fazer o meio-campo com o Corinthians. Ambos tiveram de optar por uma experiência, posto que, com exceção do autodidata Brunoro, do Palmeiras, não existe tal profissional no mercado.
Moral da história: quem montar um curso especializado para executivo na área esportiva, por certo, haverá de ganhar muito dinheiro.

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