São Paulo, quarta-feira, 16 de abril de 1997 |
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Veja
ANTONIO DELFIM NETTO O Brasil vive um dos mais brilhantes programas de estabilização registrados na história econômica mundial. O sucesso é tão grande que produziu uma espécie de interdição do debate, que foi substituído por uma retórica agressiva. Em lugar de responder aos argumentos, procura-se desqualificar o interlocutor.O problema é que os fatos são mais fortes. Lentamente está ficando claro que existe uma confusão formidável dentro do governo, cuja manifestação mais recente foi a entrevista que o sr. presidente concedeu à revista "Veja". Além de atribuir ao ex-ministro Ciro Gomes o terrível equívoco cambial que vivemos, disse que não sabe onde cortar os gastos, como se as despesas com juros (6% do PIB em 1996) fossem determinadas pelo Espírito Santo! O pior é que ele finge que não vê as ligações entre os erros da política cambial, as taxas de juros "escorchantes", a terrível acumulação da dívida pública e o déficit! Mais grave é o seu descompromisso com as reformas. "Desde o começo", disse o presidente, "me bati com a equipe econômica para não dar tanta ênfase à necessidade das reformas constitucionais. Elas são importantes, mas dizer que o Real depende das reformas é mentira... Mas por motivação ideológica a equipe econômica queria (no passado?) as reformas, insistia (outra vez?) no assunto". Esse desabafo é esclarecedor. Primeiro, aprendemos que as reformas são uma exigência da "motivação ideológica" da equipe econômica da qual o presidente diverge. Segundo, podemos deduzir que os seus ataques constantes ao Congresso Nacional -apoiados por uma "mídia" misteriosamente convertida ao fundamentalismo mercadista- revela apenas o desejo de desmoralizá-lo. Se o presidente não crê na necessidade imperiosa das reformas, se crê que elas são apenas uma exigência ideológica de um bando de neobobos, por que o Congresso não pode também imaginar que elas apenas pretendem satisfazer o viés ideológico dos burocratas? Diante disso, é difícil conter o riso quando as esclarecidas classes conversadoras vão "en cortège" a Brasília exigir do Congresso as reformas. Manifestação de pura ignorância, porque não sabiam que "dizer que o Real depende das reformas é mentira"! Será que a ideologia que as domina é a dos pequenos burocratas do planalto central? Teriam feito o papel de sabujos e neobobos em vão? Estariam os intelectuais recentemente convertidos à "inexorável globalização", também fazendo o papel de neobobos? A entrevista é esclarecedora sob muitos outros aspectos. Aprendemos, por exemplo, que o presidente só propõe ao Congresso aquilo que ele pensa será aprovado. "Não proponho ao Congresso -a mesma idade de aposentadoria para homem e mulher- porque isso não passa". Mas como interpretar, então, a sua fina lógica e tremenda eficácia em propor a sua própria reeleição? Ele sabia de antemão que o Congresso a aceitaria só por sua elegância? Importante mesmo na entrevista é a sua mensagem positiva e certamente apoiada nos fatos: "No horizonte de curto prazo não existe crise visível". O que é o curto prazo? Será 1998? O leitor que descubra, porque o longo prazo vem aí... Texto Anterior: A grande marcha Próximo Texto: A qualidade na privatização Índice |
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