São Paulo, quarta-feira, 16 de abril de 1997
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A qualidade na privatização

DAVID ZYLBERSZTAJN

Boa parte dos opositores da privatização de atividades hoje exercidas pelo poder público argumenta com a suposição de que, por visar o lucro, a empresa privada tende a lesar o cidadão.
Por um lado, para aumentar a receita, o empresário recorreria à majoração de tarifas. Na outra ponta, a redução dos custos levaria a uma deterioração na qualidade do serviço prestado. De modo que o consumidor acabaria por pagar mais por algo pior.
Felizmente, tal argumentação não se aplica à desestatização do setor elétrico paulista. O aumento contínuo da qualidade da energia é compromisso inegociável de nosso programa.
Isso porque, além do respeito pelo cidadão, o governo do Estado acredita que, tendo em vista o atual estágio de maturidade econômica, daqui em diante a qualidade passará a ser fator prevalecente, um parâmetro vital de competitividade entre Estados.
No caso específico da energia, a qualidade é determinante, principalmente na indústria. Um pico de tensão, por exemplo, pode danificar equipamentos, interromper o processo produtivo. Isso significa elevação de custos, preços maiores e, no final, prejuízo para o consumidor.
É o que motivou a Secretaria de Energia a lançar ao debate o Projeto de Qualidade no Fornecimento de Energia Elétrica, que fará parte dos editais de venda das energéticas paulistas (Cesp, Eletropaulo e CPFL) e terá grande impacto na atração de novas indústrias para São Paulo.
Dividido em três etapas, o projeto disciplina a avaliação de indicadores de desempenho do fornecimento de energia. No Brasil, isso é inovador. Propõe níveis de qualidade que, caso transgredidos, resultarão em punição do concessionário em favor do consumidor.
Se, por exemplo, deixar faltar energia por tempo além do limite tolerável, a empresa terá de pagar uma multa para o consumidor. É uma forma certamente eficaz de obrigá-la a estar sempre atenta à questão da qualidade.
Os padrões de qualidade, inicialmente regionalizados, convergirão progressivamente para um patamar único válido para todo o Estado. Em outras palavras, teremos um "padrão São Paulo de qualidade", baseado nos mais exigentes parâmetros internacionais.
O fato de o projeto estar sendo apresentado com antecedência é mais uma prova de que temos dedicado especial cuidado à definição prévia das regras do jogo. Para que o capital privado assuma a responsabilidade de operar e investir nos serviços públicos é fundamental que as regras sejam amplamente conhecidas, estáveis e duradouras.
Incertezas significam aumento do risco, do qual o empresário teria duas formas de se proteger: oferecendo ao Estado menor valor na hora da privatização e propondo-se a cobrar uma tarifa mais alta pela prestação do serviço. Portanto, no fim, quem paga pelo risco das incertezas é a sociedade.
Quanto à outra suposição -de que as tarifas sofreriam grande aumento após a privatização-, o cabimento é ainda menor. Primeiro, porque os preços serão estabelecidos no contrato de concessão, o que elimina a hipótese de abuso. Além disso, eventuais mudanças nos valores só serão possíveis após decorrido o período estipulado no contrato para a primeira revisão tarifária.
O cenário mais provável é o de empresas mais eficientes, operando com ganhos de produtividade e custos decrescentes. A revisão, dessa forma, tende a reajustar as tarifas para baixo.
Resta, pois, a opção de levantar polêmica no plano ideológico, com os conhecidos argumentos nacionalistas de soberania, patrimônio do povo etc. Mas será difícil obter o apoio popular a essas teses, pois o governo Covas tem demonstrado que o objetivo da privatização é garantir ao consumidor serviços de maior qualidade. Para o cidadão, isso interessa mais que a propriedade das hidrelétricas, se pública ou privada.

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