São Paulo, quinta-feira, 17 de abril de 1997
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Antonio Ermírio vai a FHC

CELSO PINTO

A reta final do leilão da Vale do Rio Doce levou o empresário Antonio Ermírio de Moraes, da Votorantim, a fazer algo que não costuma fazer: procurar diretamente o presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, para discutir o rumo que os fundos de pensão irão tomar no negócio.
A conversa aconteceu na noite de segunda-feira, em Brasília. Antonio Ermírio, que lidera um dos consórcios que vão disputar a Vale, estava preocupado com a tendência dos fundos de pensão estatais de se juntarem ao consórcio concorrente, liderado pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN).
O presidente respondeu que o governo não iria interferir na decisão dos fundos de pensão. Terça-feira, os fundos -liderados pela Previ (Banco do Brasil), que tem 8% do capital votante da Vale- disseram estar na fase final de negociação com o consórcio da CSN. O Centrus (Banco Central), com 2% do capital da Vale, já havia anunciado sua adesão à CSN.
A adesão de Previ, Petrus, Funcef e Funcesp, contudo, ainda não foi formalizada. Uma fonte próxima à negociação garante que o consórcio Votorantim-Anglo American cedeu em vários pontos que os fundos queriam, como poder de veto e direito a voto qualificado nas decisões. As propostas dos dois consórcios para os fundos, hoje, já seriam muito parecidas.
Existe uma diferença importante de estilo entre os dois consórcios. O da Votorantim-Anglo tem um claro interesse estratégico na Vale e a intenção de ter um modelo mais rígido de gestão, para evitar conflitos. A idéia original era ter um consórcio sustentado em três pilares, com três vozes ativas: o nacional, comandado pelo Votorantim (40%); o estrangeiro, comandado pela Anglo (40%); e o institucional, comandado pela Previ (20%).
A CSN imagina um modelo mais flexível de gestão compartilhada, o que atrai mais a bancos e fundos, que vêem a Vale principalmente como um investimento financeiro. A própria CSN, quando foi privatizada, seguiu um modelo aberto, com mais investidores financeiros do que estratégicos. O resultado foi um custoso conflito entre acionistas durante os dois primeiros anos, até clarificar o comando.
Em teoria, os dois modelos podem funcionar, mas o da CSN talvez seja mais trabalhoso. Para os fundos, é importante apostar no grupo certo. Se estiverem no grupo perdedor, é óbvio que poderão se compor com o vencedor, mas sem qualquer regalia. O momento para barganhar é agora.
O consórcio que ficar sem os fundos, de todo modo, poderá chegar à maioria controladora. O BNDESPar mais a Valia (fundo da Vale) e a Investvale (dos funcionários da Vale) vão se juntar ao vencedor para dar a maioria.
A Vale faz sentido tanto como investimento estratégico quanto financeiro. José Pio Borges, vice-presidente do BNDES, calcula que o retorno da Vale com um dono privado pode chegar a 20% ao ano. Um sócio importante do grupo CSN, o Nations Bank, vai entrar com US$ 1,2 bilhão em empréstimos e de US$ 300 milhões a US$ 400 milhões em participação, provavelmente metade para clientes seus e outra metade para terceiros (uma participação foi oferecida ao grupo de George Soros).
Capitalismo popular A venda do controle da Vale é crucial, mas a segunda etapa, da pulverização, pode ser muito mais vistosa do ponto de vista político. O BNDES já contratou a britânica Dewe Rogerson para avaliar o potencial e a melhor forma de pulverizar a venda das ações da Vale junto ao público.
Dos US$ 2 bilhões restantes da Vale, metade deve ser vendida no exterior, um quarto para investidores institucionais e um quarto para o público (talvez com o uso optativo do FGTS). Será a entrada do Brasil na fase do "capitalismo popular", que tantos dividendos políticos trouxe para a Grã-Bretanha.
Antes da Vale, o BNDESPar vai pulverizar US$ 400 milhões em ações da Petrobrás e, até o fim do ano, venderá outro tanto da Light.
O segredo do sucesso político é vender a um preço que garanta um lucro a quem comprar. Como o modelo da Vale valerá também para as empresas elétricas e de telecomunicação, o ano da eleição presidencial poderá coincidir com uma festa de ganhos da classe média com ações -se não houver alguma guinada econômica desfavorável, aqui ou no exterior.

E-mail CelPinto@uol.com.br

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