São Paulo, segunda-feira, 21 de abril de 1997
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Mais terra aos sem-terra

JOSÉ SERRA

A marcha a Brasília comandada pelo MST elevou ao máximo a simpatia internacional pelos pobres brasileiros. Acrescentou, nos países desenvolvidos, um quarto ponto na agenda de suas preocupações com o Brasil, até há pouco centralizada em três questões: índios, direitos humanos e meio ambiente.
Tal simpatia expande-se à vontade porque o movimento, apesar de um ou outro gesto mais afoito, é distante do modelo do Sendero Luminoso peruano ou dos zapatistas de Chiapas. Seria inconcebível o papa, as ONGs ou as igrejas européias apoiarem um MST engajado na preparação de algum exército de libertação.
Mas a solidariedade externa teria um valor inestimável se contribuísse também para a resolução prática dos nossos problemas de pobreza. Uma das ações possíveis, como lembrou o presidente Fernando Henrique, tem a ver com as restrições dos países desenvolvidos às exportações brasileiras, incluídos os produtos agrícolas.
Com mais exportações agrícolas (poderíamos até duplicá-las) melhoraríamos tanto o emprego como as condições financeiras para os assentamentos.
Só para exemplificar: a União Européia dá elevados subsídios aos seus agricultores; opõe barreiras a nossas exportações de produtos pecuários; discrimina nossas bananas (isso mesmo) em favor da sua própria produção ou das ex-colônias africanas.
Dificulta nossas exportações de papel (para beneficiar a Escandinávia). Para ajudar o combate ao narcotráfico, prefere o café colombiano ao brasileiro. Discrimina o café solúvel, o suco de laranja e o frango brasileiros.
Dá àquelas ex-colônias africanas um tratamento preferencial generalizado e prepara-se para excluir totalmente o Brasil das facilidades comerciais que concede aos países subdesenvolvidos.
Os Estados Unidos têm suas quotas tarifárias em cima de nossos produtos lácteos, tabaco, produtos que contêm açúcar e álcool etílico e seus impostos de importação sobre frutas e derivados (suco de laranja), para não mencionar os subsídios às suas exportações (frango e óleo de soja), e as barreiras sanitárias e fitossanitárias, utilizadas como arma de comércio.
Além disso, o Brasil é o único país latino-americano que não desfruta de isenção de tarifas na sua importação de açúcar.
Éramos, até meados de 80, o maior exportador de etanol para os EUA, mas a elevação de tarifas de importação e a retirada do produto brasileiro de um sistema de preferências expulsou-nos do mercado norte-americano, em favor de outros países (Caribe e Israel).
Derrubar essas barreiras daria mais terra aos sem-terra. Isso, para o MST, deveria ser mais importante do que a não privatização da Vale. Portanto, não seria fora de lugar que mobilizasse ajuda externa também para esse objetivo.

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