São Paulo, quarta-feira, 23 de abril de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Enterro vira protesto de luta pela terra

LUIZ FRANCISCO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM PAU BRASIL (BA)

O enterro do índio pataxó Galdino Jesus dos Santos, 45, transformou-se em uma manifestação política de luta pela terra. Santos foi enterrado no início da noite de ontem, no cemitério da reserva Caramuru-Catarina-Paraguassu, em Pau Brasil (BA).
O corpo de Santos foi enterrado ao lado do irmão João Cravinho, assassinado em uma emboscada com golpes de facão em 1988. Os acusados do crime são fazendeiros que ocupam as áreas reivindicadas na Justiça pelos pataxós.
Apenas os 1.700 índios da comunidade foram autorizados pelos líderes da tribo a acompanhar o enterro. Além dos índios, cerca de mil pessoas participaram do velório. Apesar de proibir a presença de estranhos no enterro, os líderes da tribo aceitaram a presença de fotógrafos e cinegrafistas.
No velório, houve manifestações em favor da reforma agrária.
O corpo do índio chegou ao aeroporto de Ilhéus (429 km ao sul de Salvador) às 11h45, em um avião Bandeirante da FAB (Força Aérea Brasileira).
O pai do pataxó, Juvenal Rodrigues, 60, e dois índios da aldeia viajaram no mesmo avião. Antes de ser colocado em um carro da Polícia Federal, o caixão recebeu duas coroas de flores de patrulheiras da Polícia Rodoviária Federal.
Até chegar à aldeia, o cortejo parou duas vezes. Em Arataca (BA), cerca de 30 sem-terra, com bandeiras do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), incorporaram-se ao cortejo.
"Queremos que a Justiça brasileira demonstre que também está do lado dos mais fracos, punindo severamente esses assassinos", disse o coordenador-regional do MST de Itabuna (469 km ao sul de Salvador), João Passos, 32.
Na entrada de Pau Brasil (580 km ao sul de Salvador), o carro com o corpo do índio parou novamente. Cerca de 20 índios de sua tribo fizeram um ritual de protesto. "Perdemos um irmão, mas a luta continua", disse Elquesson Carlos Silva Santana, 27, primo de Santos.
A tribo reivindica a demarcação de uma área de 36 mil hectares, doada aos índios na década de 20. Eles controlam hoje 1.079 hectares.
A chegada do corpo do pataxó a Pau Brasil praticamente parou a cidade. A praça da prefeitura -a principal do município- foi ocupada por cerca de 2.000 pessoas, segundo a Polícia Militar.
Às 14h30, o corpo de Santos chegou à aldeia. Recebido por índios pintados para guerra, o caixão foi carregado até a casa da mãe do pataxó, Minervina de Jesus, 58.
Um bispo, um frei e cinco padres celebraram a missa de corpo presente. Depois, os pataxós participaram de mais um ritual. Ao lado do caixão, os índios colocaram suas armas, cantaram e dançaram.
"Não queremos vingança, apenas justiça", disse o líder indígena Wilson de Jesus Souza.

Texto Anterior: Usuária perde telefone para a Telesp
Próximo Texto: Polícia investiga participação de jovens em mais crimes
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.