São Paulo, sexta-feira, 25 de abril de 1997
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Motta recebe denúncia contra grupo dos EUA

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

Um documento divulgado no mercado financeiro norte-americano, em fevereiro último, mostra que um grande grupo empresarial dos EUA, a McCaw International, conseguiu entrar no mercado brasileiro de telecomunicações, burlando a legislação do país.
Cópias do documento foram enviadas, anonimamente, ao ministro Sérgio Motta, aos consórcios internacionais que estão disputando a concorrência para as concessões de telefonia celular privada (banda B) e órgãos de imprensa.
Motta confirmou, por meio de sua assessoria, que recebeu o documento e que considerou as informações "muito graves".
O serviço começou como um sistema de rádio -desses usados por táxi e por frotas de caminhões-, mas evoluiu para a tecnologia digital, o que lhe permite funcionar como um serviço de telefonia celular altamente sofisticado.
A própria empresa informou nos EUA que possui 1.700 canais de frequência para uso de "trunking" no Brasil. Ela já é a principal operadora desse serviço -ainda com tecnologia antiga- na cidade de São Paulo, onde possui 195 dos 420 canais de frequência disponíveis na capital paulista.
O problema está no fato de que a empresa norte-americana atingiu essa posição comprando empresas brasileiras que receberam as concessões gratuitamente durante os governos Collor e Itamar.
A legislação brasileira diz que a transferência de controle dos canais de frequência só pode ser feito após prévia anuência do Ministério das Comunicações. O governo brasileiro não foi consultado sobre a compra das empresas.
O ministério divulgou a relação das empresas que possuem permissão para explorar o "trunking" no país e a McCaw não está entre elas. Ou seja, formalmente, o governo desconhece a existência da empresa no país.
Procurados das 19h às 22h30, nenhum responsável pela empresa norte-americana foi localizado.
O documento foi preparado por quatro instituições financeiras internacionais -Chase Securities, Morgan Stanley, Lehman Brothers e Natwest Capital- para fornecer informações a investidores norte-americanos sobre os empreendimentos da McCaw fora do país.
A empresa norte-americana lançou US$ 500 milhões em títulos nos EUA para financiar a expansão de seus negócios fora de seu país e por isso tornou públicos os detalhes sobre sua presença Brasil.
Estratégia de compra
O documento divulgado para respaldar o lançamento dos títulos de dívida da McCaw nos EUA conta como a empresa entrou no país e os riscos que ela corre por não estar enquadrada na legislação.
Os norte-americanos entraram no mercado brasileiro de forma tumultuada. A partir de 93, uma empresa também sediada nos EUA, chamada Wireless Ventures of Brazil (WVB), começou a comprar empresas brasileiras que possuíam concessões para o serviço no país. A maioria só valia pela concessão, pois não havia sequer instalado o serviço. Em 96, a maior empresa de "trunking"dos EUA, a Nextel, comprou 81% das ações da WVB. A Nextel é controladora da McCaw International.
Disfarce
Em 1994, o então ministro das Comunicações, Djalma Morais, baixou portaria (nº 478), segundo a qual nenhuma empresa pode receber mais de uma concessão (de 20 canais) para o serviço de "trunking" em uma mesma cidade.
A portaria diz que as permissões só poderiam ser transferidas depois que o serviço estivesse em funcionamento e mediante prévia concordância do ministério.
Para burlar a portaria, a WVB mudou sua estratégia: ao invés de comprar a totalidade das ações das empresas, como vinha fazendo, passou a comprar apenas 49%, mas ficava com um contrato na gaveta que lhe dava opção para comprar os outros 51%.

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