São Paulo, domingo, 27 de abril de 1997![]() |
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Veneno de cobra e sangue de boi viram "cola biológica"
ROBERTO IIZUKA
Batizada de cola de fibrina, a cola biológica está sendo desenvolvida por uma equipe do Centro de Estudos de Veneno e Animais Peçonhentos (Cevap), da Faculdade de Medicina e da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade Estadual Paulista de Botucatu (Unesp), em São Paulo. A cola já foi testada em seis pacientes que sofriam de câncer de pele na região do nariz. "É mais rápido passar uma substância adesiva do que dar ponto. O sangramento é menor. Além disso, verificamos que a cola impede a formação de marcas, comuns quando o paciente que se submete a uma operação é suturado com pontos cirúrgicos", diz Silvia Regina Barraviera, uma das autoras do estudo. Segundo a pesquisadora, os resultados mostraram que o processo de cicatrização levou 48 horas e que não houve ocorrência de processo inflamatório. Os testes, preliminares, indicaram ainda que a cola de fibrina apresentou bons resultados em cirurgias de órgãos internos, como o intestino. Imitando a coagulação A cola de fibrina reproduz, no corpo do paciente, o que acontece depois que alguém se corta: a coagulação sanguínea. A coagulação é um mecanismo vital contra as perdas excessivas de sangue. O resultado do processo é a formação de uma espécie de rede de proteínas -a rede de fibrina-, que impede que as células do sangue continuem saindo do corpo. É essa "massa" de células e de proteínas, chamada coágulo, que impede que o sangue continue extravasando. Para imitar o que acontece naturalmente, os pesquisadores precisaram encontrar, na natureza, as substâncias que, em contato, permitem que a rede de fibrina se forme: o fibrinogênio e a trombina. "Fibrinogênio de vários animais foram estudados e chegamos à conclusão que o mais parecido com o humano era o bovino", diz a bióloga Izolete Aparecida Thomazini Santos. Veneno de cascavel O rendimento da processo é de aproximadamente 20%, isto é, de cada um grama do veneno pode-se extrair 200 miligrama de like-trombina. Segundo os cientistas, a jararaca também tem a fração like-trombina, mas resolveu-se optar pela cascavel porque é a mais encontrada na região de Botucatu. Colas biológicas As colas biológicas estão no mercado desde a década de 70. Entretanto, ao contrário da cola desenvolvida pela equipe da Unesp de Botucatu, usam como um dos componentes o fibrinogênio humano, que, por ser um derivado do sangue, que pode transmitir doenças como a hepatite. Foi o perigo de contágio, por exemplo, que levou a FDA, a agência que regula medicamentos e alimentos nos EUA, a proibir, em 1978, o uso de colas biológicas no país. Além de não expor pacientes ao risco de contrair doenças, a cola de fibrina deverá ser mais barata que as colas biológicas existentes no mercado, cujo kit custa em torno de US$ 126. "A cola de fibrina deve girar em torno de US$ 35", afirmam os pesquisadores. Segundo a farmacêutica Maria José Soares, além de desenvolver uma cola biológica tão eficiente quanto as similares, a pesquisa abriu campo para o uso da like-trombina, que até então não tinha aplicação biotecnológica. "Acreditamos que a cola tenha mais vantagens, que serão descobertas com o prosseguimento da pesquisa", diz Barraviera. Segundo ela, testes em animais também indicaram diminuição do tempo gasto em operações. Os pesquisadores vão testar a cola em outros 20 pacientes. Texto Anterior: Um inédito de Callado Próximo Texto: Cicatrização envolve a proteína colágeno Índice |
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