São Paulo, segunda-feira, 28 de abril de 1997
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Chanceler japonês faz 1ª crítica ao Peru

IGOR GIELOW*

IGOR GIELOW; MARTA AVANCINI
ENVIADO ESPECIAL A LIMA

Apesar de reiterar agradecimento por fim da crise dos reféns, Ikeda diz que ela poderia ter sido evitada

O chanceler do Japão, Yukihiko Ikeda, fez a primeira crítica pública ao Peru pela crise que manteve 72 reféns por 126 dias presos na casa do embaixador de seu país em Lima.
Segundo Ikeda, "se o governo peruano conhecesse melhor o MRTA, a crise talvez não tivesse ocorrido". Ele não detalhou a afirmação. "O governo anfitrião é responsável pela segurança das representações diplomáticas", disse também.
A casa do embaixador Morihisa Aoki ficou quatro meses sob poder de 14 guerrilheiros do MRTA (Movimento Revolucionário Tupac Amaru), sendo invadida por militares na última terça com o saldo de um refém, dois militares e todos os terroristas mortos.
Havia 40 japoneses entre os reféns. Apesar da crítica, Ikeda reiterou elogios pelo fim da crise. No dia da ação, o premiê japonês, Ryutaro Hashimoto, lamentou não ter sido avisado de antemão da ação, mas também a elogiou.
O presidente peruano, Alberto Fujimori, não estava presente quando Ikeda fez suas declarações no fim da tarde de sábado.
O diário japonês "Nihon Kezai Shimbun" relatou que o assessor do Serviço de Inteligência Nacional, Vladimiro Montesinos, o embaixador dos EUA no Peru, Dennis Jett, e o Defensor do Povo, Jorge Santisteban de Noriega, teriam convencido o presidente a optar pela solução militar da crise.
Exumações
O Instituto de Direito Legal de Lima informou ontem que vai pedir a exumação de 12 guerrilheiros enterrados sem a presença da família. Apenas o líder da ação, Néstor Cerpa, e de seu adjunto, Roly Rojas, foram identificados.
"Foi violado um direito básico. Sabemos que pelo menos seis deles estavam identificados. Por que não houve um laudo detalhado? As famílias têm direito a exumação e necropsia independente."
A crítica foi feita por uma diretora do instituto à Folha. Para Susana Villaram, o fato de as necropsias terem sido feitas pelo mesmo Exército que matou os terroristas "como cães", como definiu, é suspeito. A Folha esteve ontem no Hospital da Polícia Nacional, onde os corpos dos 14 guerrilheiros passaram por necropsia. O único documento disponível é o de Néstor Cerpa, que traz na "causa mortis" a designação "ferimentos a bala".
Massacre
Diversos protestos alimentam a versão segundo a qual alguns membros do MRTA foram mortos deliberadamente.
Segundo o jornal japonês "Asahi Shimbun", Fujimori deu ordens para a execução de todos os terroristas do MRTA. O presidente negou a existência de tal ordem.
O Colégio dos Advogados de Lima, por exemplo, quer saber como foi atingido e atendido o único refém morto na ação, o juiz Carlos Giusti. A Folha revelou que alguns ex-reféns dizem que o juiz morreu vítima de um tiro do próprio Exército.
Outras versões sobre o cativeiro não param de surgir. "Só havia três opções, a militar, a pacífica e a interna. Esta última consistia numa ação dos 72 reféns contra os 14 subversivos. Era muito difícil", afirmou o congressista Samuel Matsuda, um ex-refém.
Felicita Cerpa, mãe do líder do MRTA na ação em Lima, deve apresentar ainda esta semana uma denúncia formal à Comissão de Direitos Humanos da ONU, em Genebra (Suíça), contra os governos peruano e japonês.
"Queremos uma investigação minuciosa do que realmente aconteceu na casa do embaixador do Japão", disse Felicita à Folha.

*Colaborou Marta Avancini, de Paris

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