São Paulo, segunda-feira, 28 de abril de 1997
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Por uma previdência complementar digna

Por uma previdência complementar digna
Uma articulação

LUIZ GUSHIKEN; RICARDO BERZOINI

Uma articulação por uma previdência complementar digna e confiável seria uma defesa da cidadania
LUIZ GUSHIKEN e RICARDO BERZOINI
Assistimos neste final de século a um debate de importância fundamental: como garantir um padrão digno de vida aos trabalhadores na aposentadoria?
No Brasil, durante décadas, a luta dos sindicatos de trabalhadores em torno do direito a uma justa aposentadoria esteve centrada na Previdência pública. Porém, é fato notório e inquestionável que as debilidades da Previdência pública acabam por criar a necessidade de o trabalhador contar com instrumentos auxiliares, como fundos de pensão, entidades abertas, institutos de previdência estaduais e municipais etc.
No que diz respeito à previdência complementar, o assunto é ainda pouco conhecido e debatido pela sociedade brasileira, apesar de já movimentar bilhões de reais. Geralmente, o debate gira em torno de seus aspectos negativos, como manipulação indevida dos recursos, nocivas interferências dos governantes no interior do sistema, ausência de democracia na gestão dos recursos e inoperância dos órgãos públicos responsáveis pela fiscalização.
Tais fatos, somados à experiência frustrada dos montepios que, por falta de fiscalização e regulamentação, prejudicaram milhões de brasileiros, têm alimentado a desconfiança e o descrédito na previdência complementar.
Em nosso país, temos duas modalidades atuando nessa área: de um lado, as entidades abertas de previdência, cujos planos, individuais ou coletivos, são comercializados livremente no mercado por bancos e seguradoras, com a cobrança de altas taxas de administração.
Já as entidades fechadas -genericamente chamadas "fundos de pensão"- não têm fins lucrativos e estão circunscritas a planos coletivos baseados no vínculo empregatício. O financiamento dessas entidades se dá mediante contribuição dos empregadores e dos empregados. Há empresas que pagam integralmente as contribuições ao fundo de seus funcionários.
Os fundos também são uma ótima opção para a empresa, que, por meio de vários benefícios legais, têm nessa forma de aposentadoria complementar um poderoso instrumento de política de recursos humanos, valorizando o funcionário e dando-lhe mais segurança e tranquilidade quanto ao futuro.
Hoje, no Brasil, o sistema de fundos de pensão fechados contempla mais de 2 milhões de pessoas, com um patrimônio superior a R$ 70 bilhões (10% do PIB). São mais de 350 fundos, a maioria vinculada a um universo de cerca de 1.500 empresas privadas, como, por exemplo, Brahma, Varig, IBM, Rhodia e Philips. Nos EUA, os planos previdenciários movimentam cerca de US$ 5,4 trilhões (mais da metade do PIB americano). No Japão, cerca de US$ 1,5 trilhão. Na Europa, os valores são igualmente gigantescos.
São esses recursos que contribuem decisivamente na formação da poupança interna das economias desses países, gerando empregos e possibilitando investimentos de longo prazo em setores vitais da economia.
É a importância estratégica de recursos dos trabalhadores, aplicados em planos de previdência complementar, que queremos realçar, tomando-a como fundamento para uma ação na qual os sindicatos sejam os protagonistas da expansão e da direção dos planos previdenciários, da construção de uma credibilidade social para esses projetos.
A possibilidade de sindicatos, associações profissionais e cooperativas de produtores organizarem planos de previdência para seus associados, a participação dos representantes dos trabalhadores na direção dessas entidades, o direito à portabilidade das reservas, a manutenção da imunidade tributária dos fundos fechados e a luta por isenção fiscal dos fundos abertos na parte relativa ao fundo garantidor de benefícios, o aprimoramento da legislação e da fiscalização, a transparência dos negócios e o controle patrimonial, tudo isso são bandeiras fundamentais.
Além disso, a reivindicação de que as empresas participem em planos de previdência de seus funcionários pode se transformar num ponto fundamental das negociações coletivas de trabalho.
Cremos que uma grande articulação política em favor de uma previdência complementar digna e confiável poderia se constituir numa luta em defesa da cidadania brasileira. Estaríamos fortalecendo um vigoroso instrumento de justiça social e de poupança interna, que, utilizado prioritariamente no desenvolvimento do país, poderia se converter na mais importante fonte de financiamento da infra-estrutura nacional, de geração de empregos e de competitividade dos produtos brasileiros.
Um pacto pelo futuro. Munidos desse objetivo, os sindicatos deveriam propor aos vários setores do empresariado -os que concordam em estimular a criação de fundos fechados de previdência- uma estratégia comum, rumo à adoção desse modelo previdenciário complementar como alternativa saudável, capaz de estender a milhões de trabalhadores uma aposentadoria digna.

Luiz Gushiken, 46, é deputado federal pelo PT de São Paulo. Foi presidente nacional do PT (1989-90).

Ricardo Berzoini, 37, é presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região.

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