São Paulo, terça-feira, 29 de abril de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Andreato encena Oscar Wilde no cárcere

PATRICIA DECIA
DA REPORTAGEM LOCAL

"Oscar Wilde, quando desce de seu pedestal, não é nada interessante." A frase foi escrita numa carta por lorde Alfred Douglas, ou Bosie, como Wilde preferia chamar o jovem amante que acabou provocando seu encarceramento na prisão de Reading há exatamente cem anos.
Mas o julgamento do rapaz se mostra equivocado para quem assistir a "Oscar Wilde", o monólogo escrito e interpretado por Elias Andreato, que estréia na próxima sexta-feira em São Paulo.
Tendo por base o texto "A Balada do Cárcere" (De Profundis), uma carta a Bosie escrita nos dois anos de prisão, Andreato mostra a transformação do dândi excêntrico, louco pela fama, num homem que conhece o sofrimento provocado pelo total abandono.
Frasista brilhante, Wilde recebeu uma edição primorosa nas mãos de Andreato, que passou oito anos trabalhando no projeto. Passagens de "A Alma do Homem sob o Socialismo", ensaio em que o escritor irlandês dispara conceitos sobre a arte e a imprensa, e de "O Retrato de Dorian Gray" também foram adicionadas.
Vestindo apenas camisa, cuecas brancas e um sapato alto de camurça preta, Elias dá início aos 50 minutos de espetáculo dizendo: "Pior do que falarem mal é não falarem de você".
Cela cenário
O cenário, quase completamente vazio, representa a cela onde Wilde esteve em Reading. Há um espelho, uma taça, uma poltrona e um varal com quatro pares de meias de seda. Mas é o retrato gigante de Bosie, pintado em uma das paredes, que preenche e domina a cela.
Aos poucos, o ator veste o terno vermelho, deixando para o fim a casaca com lapelas de veludo negro -Wilde era obcecado por roupas, desenhando casacas "revolucionárias" para si próprio.
Mas alguns detalhes não deixam esquecer que Andreato incorpora um Wilde decadente: a cabeça está coberta por uma rede de cabelo, apenas uma das mãos tem as unhas esmaltadas e, sob os olhos, há grossos traços de maquiagem.
"Ele se deixou seduzir pela coisa. Foi testando sua ironia, até que num momento estava totalmente só. O que fica é o sofrimento, a transformação, a beleza da alma", diz o ator.
Homossexualismo
A direção de Vivien Buckup marca pelo trabalho corporal exibido por Andreato. "Trabalhamos muito os trejeitos do personagem, o que viria do feminino, da caricatura", afirma ele.
A homossexualidade de Wilde -na verdade o fato que define seu destino- fica ressaltada ainda no postal, que serve como uma espécie de programa da peça e é distribuído no início do espetáculo. No cartão, Andreato posa como São Sebastião.
"Quando terminei o roteiro, queria que o final fosse uma imagem de São Sebastião flechado. Essa era a imagem que mais definia o personagem, um misto de êxtase e sofrimento. Depois, descobri que era um dos quadros de que Wilde mais gostava. Além disso, São Sebastião acabou sendo uma imagem adotada pelos gays. Isso define muito a personalidade e o universo da peça", diz o ator.

Peça: Oscar Wilde
Autoria: Elias Andreato
Direção: Vivien Buckup
Onde: Studio Cristina Mutarelli (av. Nove de julho, 3.913, tel. 011/885-7454) Quando: sexta a domingo, às 21h30
Quanto: R$ 15

Texto Anterior: Coluna Joyce Pascowitch
Próximo Texto: 'Aranha' de Louise Bourgeois volta ao parque Ibirapuera
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.