São Paulo, quinta-feira, 1 de maio de 1997
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Cinema brasileiro continua na busca de seu caminho

ALFREDO STERNHEIM
ESPECIAL PARA A FOLHA

Muito oportuno o debate entre cinco diretores brasileiros promovido pela Folha e publicado pela "Ilustrada" em 25 de abril último ("Novos cineastas querem mudar o foco").
Nessa troca de opiniões, ficou patente uma auspiciosa diversificação e ausência de um sectarismo ideológico que já andou fazendo muito mal ao nosso cinema.
O melhor do encontro foi apontar a existência do "cafetão da produção" surgido em decorrência da lei do audiovisual.
Na verdade, esse subfaturamento nos orçamentos a favor dessa figura ou de outros (às vezes dos próprios produtores que não querem muito risco) já existe desde os tempos da Embrafilme. O vício fez com que muitos cineastas nos anos 70 e 80 vivessem de forma nababesca com filmes que não recuperavam nem metade dos gastos.
Raramente essa prática é denunciada por gente da própria categoria. Ponto para os cinco diretores por enfatizarem a mentalidade de levar vantagem na produção.
Por outro lado, é lamentável que eles não tenham mostrado nenhuma crença na possibilidade do cinema brasileiro se autofinanciar, ter filmes que gerem a procriação de outros através das receitas obtidas nas salas de exibição, na TV ou em vídeo.
Acomodamento
Mas essa omissão não chega a causar surpresa, pois tanto nesse debate como em outros, os diretores mostram uma postura de acomodamento no mecenato oficial ou particular.
É válido, sobretudo quando se rejeita os subsídios paternalistas e corruptos do passado, mas passa-se ao largo nos problemas de mercado, da conquista de um público maior e fiel. Parece existir constrangimento ou vergonha de se tratar do consumo popular.
Pode-se dar um desconto, considerando-se a juventude dos cineastas. Por isso, Paulo Caldas é ingênuo ao afirmar que "o público gosta de filme bom, não gosta de filme ruim, não interessa de onde ele vem". Mas o acesso ao mercado continua se mostrando complicado, sem apoio nessa fórmula tão simplista. Basta verificar que em 1996, foram lançados em São Paulo cerca de 275 produções estrangeiras e 16 brasileiras.
E dessas fitas nacionais, somente duas ou três chegaram aos circuitos comerciais. O restante foi exibido nos cinemas alternativos (Espaço Unibanco, CineSesc) que, pelas próprias dimensões, não alcançam um público maior.
Claro que é necessário aprimorar a qualidade do nosso filme, evitar que ele emperre no diálogo, em falhas do roteiro ou em soluções pretensiosas. Aliás, a procura do brilho fácil e autoral é um dos pecados mais frequentes em nossos cineastas e se faz presente em "O Baile Perfumado". Porém, a colocação de uma produção nos cinemas, na TV e nas locadoras de vídeo independe dela ser boa ou ruim, como quer Caldas.
É preciso uma boa razão de marketing para que haja boa vontade dos intermediários entre produto e público. No caso, os cinemas, as TVs e as videolocadoras.
A reserva de mercado para um país como o Brasil, de dimensão continental, e com um comércio cinematográfico que movimenta mais de US$ 300 milhões sob o domínio da importação desenfreada é uma questão que deve ser debatida. Porém, mais uma vez, não foi.
Caso esses e outros cineastas persistam nessa ótica eufórica, olhando apenas para seus umbigos e deixando de lutar por regras fixas para o mercado sem o corporativismo pernicioso que predominou na Embrafilme, eles correm o risco de se tornarem diretores de um ou dois filmes que "passaram" pelo cinema nacional. É preciso encará-lo como indústria geradora de empregos e não apenas uma atividade esporádica e de brilho fugaz.

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