São Paulo, sábado, 3 de maio de 1997
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Pescador quer saber 'juntar palavras'

DA AGÊNCIA FOLHA, EM PONTE DOS CARVALHOS (PE)

O pescador Luiz Albino Pereira, 70, do Cabo (PE), começou a ser alfabetizado no ano passado e já sabe escrever palavras como "peixe" e "canoa", mas não sabia quem tinha sido Paulo Freire -o criador do sistema pelo qual ele está aprendendo a ler.
"Era um homem bom, não era?", disse ele, depois que integrantes do Centro de Pesquisas Josué de Castro, entidade pernambucana responsável por um programa de alfabetização no Cabo, lhe explicaram quem tinha sido o educador.
O programa tem três turmas na cidade e é baseado no sistema criado por Paulo Freire, que procura alfabetizar utilizando elementos do cotidiano dos alunos.
Pereira faz parte de uma das turmas desde o segundo semestre do ano passado. "Aprender a ler é difícil, mas quando a gente aprende fica mais forte", disse.
"Você fica sabendo o que tem nas placas, nas cartas, os preços das coisas, pode assinar o nome nas atas da sociedade", declarou. Pereira disse que também "tem vontade de um dia ler um jornal", mas que ainda está "longe disso".
Contou que, até agora, já aprendeu a escrever o nome dele e palavras soltas. Espera um dia aprender "a juntar uma com outra e entender tudo".
A palavra de que mais gosta: peixe. Em segundo lugar: mar. Em terceiro: canoa.
A que menos gosta: "Não sei. Só aprendi as que eu gosto".
Pereira é presidente (em segundo mandato) da Sociedade Beneficente de Pescadores da comunidade em que vive, Ponte dos Carvalhos (Cabo).
Filho de trabalhadores rurais analfabetos, Pereira nasceu em Ipojuca, Zona da Mata pernambucana. "Fui muito à escola, quando era menino, mas nunca aprendi a ler", disse ele.
No ano passado, resolveu tentar de novo. "Deu vontade. E também eu queria 'puxar' os outros, meus amigos, que diziam que cavalo velho não aprende mais a andar", afirmou.
A turma hoje tem 15 alunos, todos com mais de 55 anos. As aulas vão das 19h às 21h, de segunda a sexta, na sede da sociedade.
O programa tem o apoio da Secretaria Estadual de Educação e da ICCO (uma entidade ecumênica sediada na Holanda).
Pernambuco, terra em que Paulo Freire nasceu, tem 1,47 milhão de analfabetos com idade acima de 15 anos. Dezesseis mil (entre eles o pescador Pereira) estão participando de algum programa de alfabetização.

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