São Paulo, sábado, 3 de maio de 1997 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
"Mestiço É Que É Bom" traz Darcy Ribeiro irreverente e sensual
MARCELO RUBENS PAIVA
Em "Mestiço É Que É Bom" descobre-se que o Brasil teve o seu intelectual degustador: Darcy Ribeiro, o garoto encrenqueiro de Montes Claros (MG), amante de um sem número de mulheres. Como etnólogo, viveu meses no campo com seus índios, comeu da mesma comida e dividiu a cama com algumas representantes de etnias diferenciadas. Como educador, escreveu leis e fundou a Universidade de Brasília. Como idealista, assessorou diretamente três presidentes reformistas radicais de três países latino-americanos -Jango Goulart (Brasil), Salvador Allende (Chile) e Velasco Alverado (Peru). Darcy Ribeiro foi do poder e foi alijado, foi vencedor e derrotado. E era dos poucos pensadores brasileiros que experimentava, digeria e obrava seus pensamentos. Atacado pelo câncer, em 95 desencadeou uma corrida contra o tempo para ter palavras, propostas e soluções. "Mestiço É Que É Bom" é uma entrevista, um bate-papo politicamente incorreto, o inventário de um Darcy irreverente, o mesmo que deu sumiço na faixa presidencial, em abril de 64, obrigando os militares a confeccionar outra. Em outubro de 95, ele jogou conversa fora com Antonio Callado, Antonio Houaiss, Eric Nepomuceno, Ferreira Gullar, Oscar Niemeyer, Zelito Viana e Zuenir Ventura, conversa que deu num dos melhores documentos para o entendimento das aflições brasileiras. Oito intelectuais desse porte bisbilhotando ao redor de uma mesa. Fala-se de mulheres, das putas de Montes Claros, de política. Darcy lembra a paixão do gaúcho Jango por putas. "Um paulista não faria isso, nem um pernambucano, nem ninguém, só gaúcho." Numa pergunta provocativa de Antonio Callado, Darcy atropela um tabu: o sexo entre pesquisadores brancos e índios. Confessa os casos que teve com índias, "pessoas fudíveis". Revela a homossexualidade entre índios que têm "instituição cudina". Numa viagem de dois meses com os índios descobre que deveria comer o que os índios comiam, para não ter complicações intestinais. O pesquisador Darcy nota que, para entender o outro, é preciso ser um membro do grupo. Em seguida, o tema é Getúlio Vargas, aquele que "modernizou o Brasil". Curioso como Darcy constrói a ponte índios-Getúlio, passado-futuro. Esta foi a fonte da formação do político Darcy Ribeiro, antigo membro do Partido Comunista e militante do "brasilismo" (fórmula de desenvolvimento). Foi um provocador, um defensor do Brasil. Não se fazem mais intelectuais como antigamente... Livro: Mestiço É Que É Bom Lançamento: Revan Quanto: R$ 15 (158 pág.) Texto Anterior: TRECHO Próximo Texto: Revista 'Cultura Vozes' reúne sem-terra, gregos e cinema Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |