São Paulo, segunda-feira, 5 de maio de 1997
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Lula e a agenda positiva

LUÍS NASSIF

Lula decidiu aceitar o convite para uma conversa com o presidente da República, Fernando Henrique Cardoso. Para a conversa, levará uma proposta de largo espectro: arrancar do presidente o compromisso de pagar o rombo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) junto ao Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS). De preferência, já no próximo leilão da Vale do Rio Doce.
A proposta do PT foi desenvolvida pelo economista Fernando da Mata Pimentel, secretário das Finanças de Belo Horizonte, e um dos pioneiros no desfraldamento da bandeira dos fundos sociais na privatização.
A iniciativa de Lula significa avanços em várias frentes.
Primeiro, ao impedir que o FGTS sofra calote futuro, inevitável se o patrimônio das estatais não for utilizado para ressarci-lo dos rombos provocados por sucessivas políticas de governo.
A grita inconsequente contra a privatização não levou em conta que a única maneira de os fundos sociais não serem caloteados pelo governo será seu pagamento com ativos de estatais privatizadas.
Segundo, ao conferir às estatais o significado objetivo de "patrimônio do povo brasileiro". Atualmente, não são. A Vale tem lucro de empresa privada, dinâmica de crescimento de empresa privada, mas não distribui dividendos ao seu controlador -o tal povo brasileiro, por meio do Estado. Em que, objetivamente, esse patrimônio beneficia o povo?
Uma Vale com participação acionária de fundos sociais continuaria cumprindo com todas as suas funções atuais e seus dividendos serviriam expressamente para garantir a complementação de aposentadoria dos cotistas dos fundos sociais que viessem a participar de seu patrimônio.
Terceiro, ao introduzir questões objetivas na agenda política, Lula conseguirá dar uma guinada de 180 graus nessa oposição estéril à venda da Vale, nessa falta de objetividade bacharelesca, de impedir por impedir o leilão -em vez de procurar aprimorar o processo.
Papel da oposição
O papel da oposição e das esquerdas em geral precisa ser justamente este: o de negociar a transição para o novo modelo de economia que melhor satisfaça os interesses populares.
O velho modelo fechado possui uma série de características anacrônicas, que precisam ser extirpadas. Entre as quais, o estilo de gestão estatal para empresas de mercado.
O novo modelo de mercado contém direitos líquidos, certos e modernos da população, que precisam ser implementados. Entre os quais, a possibilidade de co-participar do controle das empresas, na condição de cotistas de fundos de investimento, ser beneficiária dos frutos do crescimento da empresa. E, principalmente, de ter garantido os direitos ao patrimônio do FGTS -hoje, sem lastro para sustentar os depósitos.
Em vez de remar contra a maré, o melhor papel a ser desempenhado pela oposição é entender a nova maré, colocar-se adequadamente frente aos novos tempos, e levantar bandeiras modernas e legítimas, de defesa de direitos populares efetivos. Será a maneira de encontrar bandeiras efetivas e de contribuir decisivamente para a construção do novo país.
Da parte do presidente da República, a proposta de Lula servirá para testar efetivamente sua alegada intenção de acatar propostas consistentes da oposição.
Chefias sem chefe
Está virando moda. Há um esquema de montagem de precatórios na Prefeitura de São Paulo envolvendo bilhões de dólares. E o ex-alcaide Paulo Maluf se declara inocente por não ter assinado nada nem tomado conhecimento do que ocorria ao seu lado. Não era um fuinha, era um elefante de bilhões de dólares que caminhava ao seu lado, sem que o alcaide percebesse.
Agora é o novo chefe da Polícia Civil que se declara inocente em acusações de manipulação de licitações, pelo fato de "apenas" assinar contratos milionários, confiando na lisura de procedimentos dos técnicos que os preparavam.
É preciso acabar com essa embromação. Chefe é o responsável direto pelos atos dos subordinados -especialmente atos de larga envergadura.

Email: lnassif@uol.com.br

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