São Paulo, segunda-feira, 5 de maio de 1997
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Artista exercita dom de iludir

DA REPORTAGEM LOCAL

A manipulação fotográfica por computador colocou a fotografia na mesma posição de xeque em que a pintura ficou com o surgimento da fotografia.
Com o recurso, muito usado na publicidade, o espectador já pode questionar a veracidade da imagem fotográfica e vê-la não mais como reprodutora do real.
Vik Muniz partiu dessas premissas para construir seu mundo de imagens, um mundo em que exercita seu dom de iludir.
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PUBLICIDADE - Eu ainda acho que trabalho com publicidade, com todas aquelas idéias que são pertinentes ao negócio da publicidade, mas as razões pelas quais faço isso são totalmente contrárias.
As minhas imagens estão vendendo a si mesmas de uma maneira inversa. Elas estão se vendendo porque não são transparentes. Elas estão vendendo a sua própria existência material. Elas estão mostrando tudo o que existe entre o evento e o ato fotográfico, sendo que o evento não é importante.
O que estou tentando objetivar e materializar nessas fotos é aquilo que existe entre o evento e o ato fotográfico. Ela acaba virando um produto, mas é quase um antiproduto. É como uma vacina.
ILUSÃO - Fiz um trabalho em 3ª dimensão que espanta as pessoas, pois elas acham que aquilo é uma ilusão. Na verdade, as pessoas vêem em três dimensões. Ilusão é olhar uma fotografia plana e vê-la com profundidade. A perspectiva, sim, é uma ilusão fantástica.
O desenvolvimento da pintura tem como base o desenvolvimento de estágios mentais em uma superfície plana. Se eu fizer um círculo com dez tracinhos em volta você vai ver o Sol, mas na verdade o Sol é uma bola de fogo incandescente a milhões de anos luz daqui.
Com um círculo e dez tracinhos, sua mente vai ao Sol e volta em segundos. Isso é mágica. As pessoas não vêem isso, pois estão sedadas pelo bombardeamento diário de imagens. As pessoas não enxergam a mágica da representação.
Essa sim é a função nostálgica que estou tentando reanimar. É a idéia de que o desenho é uma coisa mágica, como é mágico em uma tribo de índios, que faz pinturas no corpo, como é mágico em uma evocação espiritual.
O xamanismo tem muito a ver com desenho. Joseph Beuys, o artista alemão, fala muito de xamanismo na arte, algo que as pessoas vêem negativamente, como uma coisa new age. Isso é uma falta de fé naquilo que a representação é: mágica. Se você acredita, ela existe.

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