São Paulo, sábado, 10 de maio de 1997
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Separatistas ocupam torre de Veneza

ANDREW GUMBEL
DO "THE INDEPENDENT"

Havia acabado de amanhecer ontem quando uma voz masculina interrompeu os programas de rádio normais em Veneza com um surpreendente anúncio. "Depois de 200 anos, uma unidade regular do Exército da Sereníssima República de Veneza liberou hoje a praça de San Marco", dizia a voz com forte sotaque regional.
"Viva San Marco, Viva a Sereníssima." Não era uma piada. Ou não inteiramente.
Algo realmente espetacular havia realmente acontecido nessa cidade cortada de canais. Pouco depois da meia-noite, um grupo de oito homens vestidos de uniformes militares renderam um "vaporetto" (barco de transporte regular na cidade) no Grande Canal, embarcaram um carro blindado feito em casa e mandaram o piloto levá-los até a praça.
Lá, subiram no topo do campanário, hastearam uma bandeira veneziana e instalaram uma antena pirata de rádio, junto com seus sacos de dormir, comida para vários dias, armas e munição.
Assim começou a aventura dividida tragicomicamente entre um drama terrorista e uma farsa de costumes. Os homens se diziam guerrilheiros separatistas tentando livrar Veneza do jugo colonialista de Roma, mas estavam falando sério? As submetralhadoras eram de verdade ou de brinquedo? E o que era aquele absurdo de restabelecer a independência de Veneza 200 anos depois do colapso da gloriosa república marítima?
A polícia não quis arriscar. Isolou a praça e tentou por cinco horas fazer os homens se entregarem. No final, prepararam uma invasão, escalaram o campanário com escadas de bombeiro e prenderam os homens sem disparar nenhum tiro.
É cedo ainda para dizer quem eram os delinquentes. Mas sua aventura foi bastante divulgada antes de acontecer.
Há semanas, separatistas têm interrompido programas de rádio em Veneza com propaganda contra o "podre e corrompido" Estado italiano e convocando todos os "indômitos compatriotas do Vêneto" a se rebelarem.
A data que eles tinham em mente é a próxima segunda-feira, bicentenário da queda da República de Veneza nas mãos de Napoleão Bonaparte e início daquilo que os separatistas consideram o longo período de domínio estrangeiro no Vêneto.
Eles consideram a unificação da Itália pouco diferente das anteriores ocupações francesa e austríaca.
Essa retórica é um pouco demais até para Umberto Bossi, líder da Liga Norte, partido separatista do norte da Itália.
"Isso não é maneira de fazer uma revolução", disse.
Bossi e seus partidários pretendem declarar a independência do Estado da Padânia, com Veneza como capital, em uma cerimônia meio satírica, mas meio séria, em setembro. Se não tomar cuidado, os malucos venezianos vão se declarar independentes antes dele.

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