São Paulo, segunda-feira, 12 de maio de 1997
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"Legalização é pior saída para combater as drogas"

LUCIA MARTINS
DA REPORTAGEM LOCAL

A descriminação das drogas ilícitas é a pior saída para o problema do uso abusivo e do tráfico de entorpecentes no mundo. Ela deve ser evitada a qualquer custo.
Essa é a base do pensamento de James Dandridge, 65, responsável pela formulação dos programas de combate às drogas dos EUA, o maior mercado de substâncias alucinógenas no mundo.
"As pessoas dizem 'legalize' porque acham que isso fará com que os crimes não existam mais. Mas isso não resolve porque os dependentes das drogas continuam existindo", diz Dandridge, conselheiro sênior do Departamento Internacional de Narcóticos e Assuntos Legais dos EUA.
Para defender seu argumento, Dandridge critica as experiências de legalização em países da Europa, como Holanda e Suíça. "Os problemas sociais aumentaram." Sobre o Brasil, Dandridge diz que faltam mais programas de prevenção e educação nas escolas.
Leia trechos da entrevista concedida à Folha na semana passada, quando Dandridge esteve em conferência sobre drogas em São Paulo, com prefeitos de todo o mundo.
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Folha - Qual a política adequada para combater o uso abusivo de drogas?
James Dandridge - Minha posição é de rejeição total à legalização das drogas.
Folha - Por quê?
Dandridge - Porque está mais do que provado que legalizar aumenta o consumo, principalmente entre adolescentes. E isso traz consequências sociais muito grandes. Legalizar é a pior saída. Ela deve ser evitada a qualquer custo. As pessoas dizem "legalize" porque acham que isso fará com que os crimes não existam mais. Mas não resolve porque os dependentes continuam existindo.
Folha - Mas o sr. não acha que criminalizar o uso de drogas acaba estimulando o usuário porque torna a substância proibida?
Dandridge - Esse argumento sempre vai existir. Precisamos de programas de educação e disseminar informações positivas. Temos que nos comportar como responsáveis seres sociais.
Folha - E os adolescentes...
Dandridge - Esse é o problema e é o foco de todo esse movimento porque eles são o alvo da comercialização das drogas. Estatisticamente, em todo lugar do mundo, o vício é maior entre os grupos com idades entre 14 até 27.
Folha - O que o sr. acha das experiências de legalização na Europa?
Dandridge - Há quatro anos a Suíça decidiu começar a distribuir, em "praça pública", heroína para todos. O resultado é que os problemas sociais, de criminalidade e de saúde pública aumentaram rapidamente. Fui à Suíça e vi a situação. É assustadora. Nós sabemos, por exemplo, que na Holanda antes de legalizar eles tinham uma das mais baixas taxas de policiais por número de habitantes. Agora, é uma das maiores.
Folha - O sr. é contra a legalização de qualquer droga, mesmo as mais leves?
Dandridge - A posição dos EUA é contra a legalização de qualquer tipo de entorpecente. Mesmo nos Estados da Califórnia e Arizona, que aprovaram a liberação da maconha para uso medicinal em plebiscitos, essa droga continua sendo proibida. Porque os médicos que prescrevem drogas à base de maconha podem, por lei federal, perder seus registros.
Folha - Mas há estudos que mostram que maconha, por exemplo, não faz tão mal à saúde...
Dandridge - A questão é a seguinte. Você diz para um adolescente que ele pode usar maconha porque não faz mal. Mas é claro que ela acaba levando para outras drogas. E aí existe uma corrente.
Folha - Na sua opinião, qual é a política ideal para combater o tráfico e o uso de drogas?
Dandridge - Concluímos que o problema das drogas não tem fronteiras. Não é um problema brasileiro, americano ou colombiano. É um problema de mercados. As drogas são o segundo produto mais comercializado no mundo, depois dos armamentos. O problema está ligado à lavagem de dinheiro, corrupção, imigração. Precisa de solução global.
Folha - Esse é o seu trabalho no governo dos EUA?
Dandridge - Exatamente. Tenho trabalhado com organizações comunitárias no mundo todo. Essa conferência de São Paulo é um exemplo. Tentamos trazer prefeitos da América Latina para saber que programas antidrogas deram certo e deram errado nesses países. Porque é no nível municipal que o problema se manifesta mais, e onde ele deve ser trabalhado.
Folha - Que autocrítica o sr. faria ao seu trabalho e ao esforço americano para combater as drogas?
Dandridge - Acho que a indústria do entretenimento tem um papel muito importante e perigoso para os adolescentes, porque eles glamourizam as drogas. Outra coisa que poderíamos fazer melhor é ser mais ativos, mais envolvidos em comunidades onde o problema é mais difícil de resolver, como nas regiões pobres, onde os jovens têm menos perspectivas.
Folha - E a situação do Brasil?
Dandridge - A situação do Brasil é muito semelhante à dos EUA. As grandes cidades, por exemplo, são afetadas pelas drogas quase do mesmo jeito que Nova York e Los Angeles. Nos EUA nós perdemos uma geração, e o Brasil está caminhando para isso. Acho que o Brasil precisa investir mais em programas de prevenção nas escolas.

LEIA MAIS sobre o seminário de combate às drogas em Cotidiano

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