São Paulo, segunda-feira, 12 de maio de 1997
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Em favor do segundo turno

HUMBERTO LUCENA

A partir da eleição de Juscelino Kubischeck para a Presidência da República, em 1955, acentuou-se a luta pela implantação do segundo turno nas eleições majoritárias, sob a liderança da velha UDN, que, inconformada com a sua derrota, alegava não ser legítima a eleição de um candidato sem maioria absoluta, pois assim alguém poderia ganhar com o apoio apenas de uma minoria.
Aquele partido que, na época, comandava a oposição, não só contestou a escolha de Juscelino, como chegou mesmo a ameaçar a sua posse, procurando envolver nessa trama importantes lideranças civis e, sobretudo, militares, criando um clima de grande intranquilidade político-institucional no país.
Não fosse a ação oportuna, vigilante e firme do ex-ministro da Guerra, general Lott, que exercia uma grande liderança no meio militar, num verdadeiro contragolpe, a 11 de novembro de 1955, e o eminente mineiro, que depois se revelou um autêntico estadista, ao fazer o Brasil crescer "50 anos em 5", sob o impulso do seu espírito democrático e conciliador, não teria assumido a Presidência da República.
Como Jânio Quadros elegeu-se presidente com expressiva maioria absoluta, numa fase em que se firmara como o nosso maior líder popular, não se falou mais no assunto, que, afinal, só voltou ao debate após 20 anos de regime militar, quando, no biênio 1987/1988, reuniu-se a Assembléia Nacional Constituinte para restabelecer, entre nós, a plenitude do Estado de Direito democrático.
Poucos opuseram-se à tese que então sensibilizou a Constituinte, no sentido da adoção do segundo turno nas eleições majoritárias, sob a justificativa de torná-las mais límpidas e legítimas, já que os candidatos só seriam considerados vitoriosos se obtivessem o apoio da maioria absoluta dos eleitores. Enfim, era um princípio democrático, que passou a ser inserido no texto constitucional, a exemplo de tantos outros países do mundo democrático.
Mas, durante a apreciação dessa matéria, na Constituinte, houve um acordo de lideranças para só se exigir o segundo turno nas eleições para prefeitos nos municípios de 200 mil habitantes para cima. Esse aspecto da questão foi muito discutido, e vários constituintes, inclusive eu, votaram contra a exclusão, sob o argumento de que se tratava de um princípio democrático, que deveria valer para todas as eleições majoritárias.
Entretanto, prevaleceu o entendimento dos líderes. E, assim, o segundo turno começou a vigorar no país, desde a eleição presidencial de 1990.
Agora, após a realização de vários pleitos majoritários nesse novo processo, nos níveis federal, estadual e municipal, começa uma forte campanha visando restringir o segundo turno apenas à eleição presidencial.
Os defensores dessa mudança afirmam que o segundo turno tumultua o pleito eleitoral, na escolha dos governadores e prefeitos, e querem aproveitar a análise das reformas políticas, no Congresso Nacional, para tentar introduzir essa inovação na nossa ordem jurídica.
Entretanto, como se trata de reforma constitucional, que, para ser aprovada, precisa do apoio de três quintos em dois turnos, nas duas casas do Congresso, separadamente, não será fácil atingir esse objetivo.
Eu e outros companheiros continuaremos defendendo os dois turnos para as eleições majoritárias, porque, na verdade, esse novo processo eleitoral, sem dúvida, dá maior legitimidade às eleições majoritárias.
Se o problema que tumultua a escolha dos governadores e prefeitos é o grande número de partidos, as próprias reformas políticas em andamento no Congresso poderão resolvê-lo.
O segundo turno é um instituto democrático e, portanto, deve se estender a todas as eleições majoritárias. Fora daí, é puro casuísmo.

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