São Paulo, terça-feira, 13 de maio de 1997
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Fomos invadidos

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Habitantes do planeta Terra, sempre tivemos medo de uma invasão vinda não sei de onde, trazendo seres estranhos que nos dominariam ou exterminariam. Orson Welles provocou aquele pânico todo quando transmitiu pelo rádio uma invasão de marcianos. Há gente que já acredita que estamos nas mãos de extraterrestres, eles estão no meio de nós e primeiramente nos dominarão, mais tarde nos exterminarão.
Outro dia, vi o presidente do BNDES na TV. Ele deve ter um tique nervoso, parece que passa a língua pelos dentes quando fica aborrecido ou quando quer explodir e ainda não pode. Vejo também, e comumente, o meu amigo Roberto Campos, não apenas na TV, mas no Arpoador, com o dr. Delamare, batemos papos substanciosos, mas sempre desconfiei que também ele não é deste mundo.
Acho que essa turma neoliberal veio de outro planeta, em expedição pioneira, criar a logística da invasão. Deve haver, no infinito mais profundo do universo, algum corpo celeste habitado, mas ameaçado de esfriamento ou explosão.
De lá partiu esse escalão avançado para preparar um mundo capaz de abrigar uma humanidade superior. E a Terra deve ser parecida com o planeta deles, apenas com um defeito: tem gente demais.
Daí que se tornaram propagadores da globalização neoliberal, que a baixo custo (ou a custo nenhum), depois de explorar e excluir, eliminará a população supérflua.
Seres superiores não poderão coabitar o mesmo mundo com sem-terra, sem-emprego, sem-saúde, sem-isso e sem-aquilo. Eles vieram de altas esferas, onde só os capazes, os fortes, os economicamente produtivos têm o direito à vida. A seleção dos que serão exterminados não será feita por uma lei moral ou ideológica, que é subjetiva, mas pelo mercado, que é objetivo.
E haverá sempre um presidente de República que seguirá o exemplo daqueles reis invadidos pelos romanos: irá esquentar as mãos na lareira do invasor.

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