São Paulo, quinta-feira, 15 de maio de 1997
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A face esquecida (e hipócrita) do governo FHC

ALOYSIO BIONDI

Durante a semana, o presidente FHC fez um duro ataque aos EUA. Bradou que a formação de um Mercado Comum englobando os países das três Américas somente poderá acontecer quando os norte-americanos deixarem de colocar barreiras de todos os tipos à entrada de mercadorias estrangeiras em seu mercado. E, também, quando os norte-americanos deixarem de conceder toda sorte de vantagens, subsídios, a suas empresas e a suas exportações.
Pois é, o presidente da República que, com sua equipe, "escancarou" o mercado brasileiro às importações e às multinacionais, destruindo a produção nacional e espalhando o desemprego, de repente confirma que seus críticos sempre tiveram razão.
Os países ricos, como os EUA, protegem seu mercado, suas empresas, seus trabalhadores. Toda a ladainha sobre globalização, "abertura" de mercado e modernização é um festival de mentiras para enganar a opinião pública. Ladainha espalhada por elites políticas e empresariais sem pudor.
O desapego do governo FHC à verdade e sua insistência em manipular a informação são uma constante -nunca abandonada- desde a sua posse. Por isso mesmo o país vive um momento de erupção de problemas assombrosos, sem que haja plena consciência de que, por trás desse quadro, está o próprio governo.
Merece atenção especial, muito especial, o problema do desemprego no país. Dizem o governo FHC e os acólitos que o endeusam que haveria maior oferta de empregos no Brasil se as leis trabalhistas fossem "flexibilizadas". Argumentam que os EUA têm expandido violentamente o nível de emprego exatamente porque, lá, as relações trabalhistas são "flexíveis". Ora, retorne-se aos ataques do presidente FHC ao protecionismo dos EUA.
É óbvio que os EUA empregaram milhões de pessoas nos últimos anos pelo fato puro e simples de terem aumentado suas exportações (e, logo, sua produção) de forma gigantesca. Como isso foi conseguido? Impedindo importações de outros países. E vendendo mercadorias para países que tiveram seus mercados escancarados por seus governos -como é o caso do Brasil.
A explosão do emprego nos EUA e a explosão do desemprego no Brasil e em outros países sem-vergonha são as duas faces de uma mesma moeda. Causa e efeito. Relação direta. O resto é mentira.
Sem-terra
O governo FHC diz que a "radicalização" dos sem-terra tem motivação política, porque agora já há empenho em fazer a reforma agrária. Mesmo? Reportagem desta Folha mostrou que, no primeiro trimestre, o Ministério da Reforma Agrária gastou apenas pouco mais de R$ 100 milhões, do total de R$ 2,6 bilhões previstos para o ano. Ou coisa de 4% a 5% do total.
Com doenças
A equipe FHC vem aplicando uma odiosa política de anunciar grandes verbas, recursos bilionários, para os diversos ministérios e de, na prática, não liberar esses recursos -nem mesmo para a área da saúde. Por isso mesmo não há vacinas tríplices para as crianças, não há vacinas contra a hepatite, não há inseticidas para matar o mosquito transmissor da dengue -e doenças típicas de países miseráveis, como a tuberculose ou a hanseníase, estão de volta. Um quadro inimaginável e que somente uma sociedade bovinamente apática aceita.
Sem verbas
A equipe FHC não libera as verbas. Depois, enganando a sociedade, ainda tem o despudor de repetir a toda a hora que "existe dinheiro", mas que este não é gasto por causa da "ineficiência dos órgãos públicos". Põe a culpa no funcionalismo.
O grito
Pequenos e microprodutores agrícolas voltam a Brasília para pedir apoio oficial. Em 1995, o presidente FHC anunciou estrepitosamente que eles teriam R$ 1,2 bilhão em empréstimos (e não em doações). Foram liberados ridículos R$ 35 milhões (com m mesmo). Em 1996, o presidente FHC repetiu a promessa. Foram liberados R$ 500 milhões. Para 300 mil famílias. Ficaram de fora outros 4 milhões.

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