São Paulo, sexta-feira, 16 de maio de 1997 |
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Governo lança 'operação abafa' e FHC enfrenta protesto em BH
CLÓVIS ROSSI
A avaliação do presidente FHC, compartilhada pelas lideranças dos partidos que o apóiam, é a de que a CPI representará a total paralisia de seu governo e do país. O primeiro passo da "operação abafa" é entregar -e rapidamente- a cabeça dos dois deputados do Acre mais diretamente envolvidos no escândalo, Ronivon Santiago e João Maia (expulsos do PFL). A Comissão de Sindicância criada pela Câmara apresentará seu relatório em prazo recorde, provavelmente já amanhã. O parecer, tanto dela própria como do plenário, "não poderá ser diferente daquele do PFL", dizia ontem o líder do PSDB na Câmara, Aécio Neves (MG), referindo-se à expulsão de Ronivon e Maia decidida quarta-feira pelo PFL. Com isso, o líder governista dá uma dimensão da pressa em queimar etapas. Antes do plenário, a Comissão de Constituição e Justiça é que terá que decidir se recomenda ou não a cassação dos deputados. Mas os partidos governistas já assumem abertamente que eles serão cassados. O que os governistas não conseguiram ainda determinar é se as duas cassações bastarão para satisfazer o que chamam de "sede de sangue" da opinião pública. Se forem insuficientes, reconhece-se entre pelo menos uma das alas governistas que não haverá como impedir a constituição de uma CPI para apurar o escândalo. O que os governistas, a começar do presidente, já têm perfeitamente claro são as consequências de uma CPI: a paralisia total do governo pelo prazo de funcionamento das investigações ou, pior ainda, até o fim do governo FHC. O próprio presidente avaliou com seus aliados que, se se chegar à CPI, seu governo pode ficar prematuramente encerrado para todos os efeitos práticos. Mas na base governista teme-se por desdobramentos ainda mais complicados politicamente. O governo ficaria nas mãos de dois parlamentares que seus próprios pares já tratam abertamente como "bandidos". A avaliação obtida pela Folha é a de que Ronivon e Maia poderão dizer o que quiserem, verdade ou mentira, a respeito, principalmente, do envolvimento do ministro das Comunicações, Sérgio Motta, na compra de votos. Como Motta criou inúmeros inimigos no Congresso e é tido, na opinião pública, como um trator, está armado um ambiente favorável para que qualquer acusação seja tomada a priori como verídica. Mesmo os que, reservadamente, admitem que o ministro não é propriamente um santo, dizem que ele jamais usaria de métodos tão rudimentares como o pagamento em dinheiro para obscuros deputados acreanos. Mas, prossegue a avaliação, o estrago agora já está feito e contamina diretamente o presidente. Mesmo os mais fiéis aliados acham que FHC jamais deveria ter criado ou, ao menos, deixado transparecer um vínculo tão íntimo com o seu agora ministro das Comunicações. Tudo o que atinge Motta respinga direta e imediatamente no presidente, raciocina-se entre os aliados mais incondicionais. Por isso, uma CPI em que o nome de Motta esteja no centro das atenções tende a se transformar em uma CPI sobre o governo FHC. Evidência de que o governo quer preservar ao máximo o ministro foi dada ontem com a decisão de Motta de não comparecer à Comissão de Sindicância, preferindo enviar por escrito o que tinha a dizer (não foge, de resto, do que já afirmara à TV, anteontem). Já Belo Horizonte ofereceu ontem amostras concretas e sintomáticas dos danos políticos à imagem do presidente decorrentes do escândalo (ver texto abaixo). FHC ficaria pouco mais de duas horas no Othon Palace Hotel, no coração da cidade, a avenida Affonso Penna, a mais tradicional de Belo Horizonte. O esquema de segurança montado para a sua chegada era impressionante, a ponto de incluir três helicópteros sobrevoando permanentemente a avenida e o Parque Municipal, em frente ao hotel. A chegada da comitiva presidencial foi precedida por um cortejo de peruas "Veraneio" utilizadas pela Polícia Militar mineira, um veículo que tem certa simbologia na história política do país (era o mais utilizado pela repressão no período autoritário). Em vez de entrar pela porta da frente do hotel, FHC foi conduzido para a lateral. Seu carro entrou em alta velocidade. Não havia uma manifestação programada para a frente do Othon. Mas a concentração de policiais atraiu cada vez mais gente, a começar dos office boys, que aproveitaram o almoço e a presença das câmeras de TV para improvisar aos gritos de: "Veja só, Fernandinho/que situação/meu salário não dá/p'ra comprar arroz e feijão". Enquanto FHC descansava na sua suite, mais policiais chegavam, agora com cães pastores, o que atraía mais gente. O que era um aglomerado de curiosos foi se transformando em um protesto. À medida que se aproximava o momento de FHC deixar o hotel, aumentava o número de presentes, o nervosismo de policiais e o ruído, agora ensurdecedor, porque o pessoal promoveu um apitaço semelhante ao ocorrido semana passada na Câmara. Quem se dirigia à praça da Estação, para juntar-se à manifestação oficial contra a Alca (ver reportagem no caderno Dinheiro), desfraldava suas faixas diante do hotel, como a do Sindifisp de Minas Gerais: "FHC - Neoditador". O general Alberto Cardoso, fardado e com a voz tranquila que lhe é peculiar, desceu para ver o que acontecia e avisou o pessoal da segurança: "Temos que tirar o homem daqui". A PM acionou os cães, improvisou um cordão com longos cassetetes de madeira e foi empurrando os presentes para a calçada em frente ou para a porta da Igreja Metodista Central, ao lado, para liberar a porta de saída da garagem. Era o sinal de que a comitiva sairia em seguida. Enquanto a disparada da "Veraneio" atraía as atenções, a porta da garagem abriu-se e os carros oficiais saíram também em disparada, um atrás do outro, seguidos por um coro forte: "Ladrão/ladrão/ladrão". Texto Anterior: Cronologia Próximo Texto: PM e manifestantes entram em choque Índice |
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