São Paulo, sexta-feira, 16 de maio de 1997
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O Proer merece um caloroso adeus

MAILSON DA NÓBREGA

Com a anunciada extinção próxima do Proer, é hora de avaliar seu desempenho.
Como se sabe, é tarefa fundamental de um banco central zelar por duas estabilidades: a da moeda e a do sistema financeiro. Sem estas, não há prosperidade econômica, paz social ou estabilidade política duradouras.
Tanto em um caso como no outro, a ação do banco central pode ser tolhida ou inibida em face de pressões políticas irresistíveis ou de desinformação da opinião pública. Daí a necessidade de ele ser independente.
Na questão da estabilidade da moeda, o banco central não pode curvar-se aos desígnios do governo para estimular irresponsavelmente a expansão econômica ou para não adotar as medidas julgadas necessárias para evitar ou combater surtos inflacionários.
No que concerne à estabilidade do sistema financeiro, a atuação do banco central é realizada de forma essencialmente preventiva. Os instrumentos são o redesconto, a garantia de depósitos, as exigências para o funcionamento dos bancos e a fiscalização.
De tão rotineiras, essas atividades passam despercebidas do grande público. Em certas situações, entretanto, o banco central pode enfrentar clamores contra ele, oriundos de segmentos pouco informados ou de políticos espertos.
Tais clamores dependem do grau de informação da sociedade ou da natureza da atuação do banco central. São maiores nos casos de risco de crise sistêmica, isto é, aquela capaz de produzir o colapso total dos bancos e do sistema de pagamentos da economia.
As somas envolvidas para atuar nesses casos costumam ser muito elevadas. Nem por isso um governo sério se intimida ou permite, se puder, que seu sistema financeiro ingresse em uma crise sistêmica. Seria o caos.
Há um claro dilema no trato dessa questão. Se o governo agir, poderá estar reduzindo a percepção do risco no sistema financeiro, o que seria um incentivo a práticas bancárias pouco saudáveis. As intervenções passariam a ser mais prováveis e mais caras.
Se o governo deixar os bancos quebrarem para preservar a noção do risco, pode amargar efeitos muito mais perversos, incluindo, no extremo, a desorganização social e econômica do país. Na dúvida, a tendência é agir.
Em anos recentes, programas para evitar crises sistêmicas foram criados na França, na Itália, no Japão, nos EUA, na Coréia e nos países escandinavos. Na América Latina, o mesmo aconteceu em cinco países: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia e Venezuela.
No Brasil, a reação ao Proer foi vigorosa. O governo jamais conseguiu convencer adequadamente a opinião pública da necessidade do programa nem do rigor com que tratou os controladores dos bancos.
A nova legislação inovou bastante. Exigiu a mudança de controle acionário nas operações do Proer, ampliou as hipóteses de indisponibilidade de bens para alcançar os acionistas controladores e fixou responsabilidades para os serviços de auditoria.
Apesar disso, as tentativas de informar foram, em grande parte, frustradas. Adiantou pouco esclarecer que era fundamental preservar a estabilidade do sistema financeiro ou que não se estava salvando bancos nem banqueiros.
A maioria preferiu ouvir os argumentos dos opositores. Era fácil dizer que não existia dinheiro para a saúde pública, mas havia para proteger banqueiros. Até hoje, a mídia ainda descreve o Proer como "um programa para salvar bancos".
Passada a tormenta, cabe comemorar os resultados. O sistema financeiro ficou mais saudável. A economia livrou-se de uma crise brutal. O Banco Central está buscando melhorar a sua ação preventiva.
O volume dos desembolsos, excluído o socorro ao Banco do Brasil, é relativamente menor do que em outros países.
Os empréstimos do nosso programa, de R$ 20,8 bilhões, correspondem a 2,8% do PIB, contra 19,6% no Chile, 13% na Argentina e na Venezuela, 8,2% na Finlândia, 6% na Colômbia, 5,1% nos EUA e 4,5% na Noruega e na Suécia.
O custo fiscal será muito menor, pois grande parte dos recursos voltará aos cofres do governo.
Até agora, considerada a diferença entre os juros cobrados no Proer e a taxa média de captação do Banco Central, a despesa efetiva é de R$ 0,6 bilhão, segundo estimativas do Ministério da Fazenda. É relativamente pouco diante dos benefícios.
Com erros e acertos do governo, incompreensões dos críticos e até má-fé, o Proer merece um caloroso adeus. O saldo foi altamente positivo. Espera-se que jamais volte.

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