São Paulo, sexta-feira, 16 de maio de 1997
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IRLANDAS

FABIO MASSARI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Se tudo der certo, o futuro nos reserva várias surpresas por conta do músico irlandês Gavin Friday.
O ex-líder da seminal banda Virgin Prunes, que agitou a sempre agitada Irlanda nos anos 70 e 80, pretende não ficar deitado sob os louros de ter feito a elogiada trilha do filme "Em Nome do Pai" (94), do diretor Jim Sheridan, onde ainda dividiu os vocais da faixa-título com o amigo Bono Vox.
Muito menos do resultado de seu último disco, "Shag Tobacco", aclamado álbum solo de 1996.
Os projetos do cantor para os próximos meses incluem novo disco solo; um musical sobre a vida de Oscar Wilde; mais uma trilha de filme para o Jim Sheridan; participação na trilha do próximo filme de Danny "Trainspotting" Boyle.
A primeira entrevista de Gavin Friday ao Brasil aconteceu no bar do suntuoso "Clarence Hotel", em Dublin, no mês passado. Dois dos três donos do hotel são velhos amigos de Gavin: The Edge e Bono Vox, ambos da banda U2.
Gavin falou por quase duas horas à Folha. Abaixo alguns trechos.
*
Folha - A impressão que dá é que "Shag Tobacco" é um daqueles discos onde tudo dá certo. E ele inaugura também mais uma fase em sua carreira.
Gavin Friday - É um dos meus discos favoritos. Depois de "Adam & Eve", meu segundo, trabalhei com trilhas para cinema, o que me deu maior articulação para mexer com arranjos. "Shag Tobacco" é muito mais definido ritmicamente. Quanto à nova fase, estou virgem de novo. Estou sem gravadora, sem contrato. Excursionei por um ano e meio para promover "Shag Tobacco" e agora estou livre para novos projetos.
Folha - Em "Shag Tobacco", o cineasta Jim Sheridan aparece nos agradecimentos. Como foi sua colaboração na trilha do filme "In the Name of the Father"?
Friday - Há perto daqui um velho teatro alternativo que costumava ser o único lugar onde bandas emergentes podiam tocar. No final dos 70, eu tinha meus 17 anos e queria tocar com os Virgin Prunes, mas ninguém deixava, porque éramos muito ofensivos. Sheridan era o diretor do núcleo de artes do teatro e nos deu nosso primeiro show. Além do mais ele é do norte de Dublin, de onde eu venho, região de trabalhadores. Embora todo mundo nos ignore, as pessoas interessantes vêm dessa região.
Para a trilha do filme, ele queria que eu entrasse na cabeça de um cara de 17 anos no final dos anos 70. Você tem que pensar nos irlandeses, nos ingleses, nas diferenças. Os irlandeses são agressivos e melancólicos. Para captar isso, tem que se envolver emocionalmente.
Folha - E quanto ao seu amigo Bono Vox. É muito difícil ser amigo de alguém tão famoso? Ele sempre faz questão de dizer que você é uma influência...
Friday - Há sempre muita pressão. Ele é uma das pessoas mais conhecidas do mundo. Conheço ele há 25 anos, desde que eu tinha uns 10. Morávamos na mesma rua, formamos bandas na mesma época. É um dos meus melhores amigos.
Folha - Existe algo que se pode chamar de "rock irlandês", e quais seriam suas características?
Friday - Acho que o aspecto que mais identifica a boa música daqui é sua espiritualidade, sua emoção. Você ouve Therapy?, Ash, parece que eles são de Seattle. Isso é rock genérico. Mas aí você ouve Sinead (O'Connor), Van Morrison, Bono e você percebe o lado espiritual.
Folha - E qual a avaliação que você faz da importância do U2 para o rock, para a música local?
Friday - Os irlandeses estavam acostumados a ser controlados, o U2 foi a primeira banda irlandesa a controlar o mundo... O U2 apareceu num momento muito diferente culturalmente. A Irlanda perdeu os anos 50 e 60, não houve revolução cultural como em Londres e Paris. Aqui a revolução aconteceu nos 70: punk. Os jovens Jim Sheridan, os jovens escritores, as bandas começaram a dizer "F... a igreja", "F... isso". E o U2 disse "F..., nós vamos para a América, não precisamos ir para a Inglaterra". O U2 é uma bandeira, que dá confiança aos irlandeses.

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