São Paulo, domingo, 18 de maio de 1997
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Deputado é chefe da "brigada moralista"

DENISE MADUEÑO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O deputado Severino Cavalcanti (PPB-PE) pode ser considerado o chefe da "brigada moralista" da Câmara.
Depois dos trabalhos à frente da comissão de sindicância para apurar a compra de votos em favor da emenda da reeleição, ele vai intensificar a batalha contra o projeto que prevê a união civil de homossexuais e o que descrimina o aborto e a favor do veto do presidente Fernando Henrique Cardoso à possibilidade de esterilização, dentro do programa de planejamento familiar.
Na primeira semana de abril, Cavalcanti foi recebido pelo papa João Paulo 2º no Vaticano e voltou de lá com um reforço na bagagem.
Acertou a vinda ao Brasil do presidente do Pontifício Conselho para a Família, Cardeal Lopez Trujillo, em setembro.
Anticomunista histórico, o deputado vive um momento de mutação ideológica.
Hoje, ele defende o fim do embargo comercial a Cuba, em defesa do "bravo povo cubano".
Padre expulso
Na década de 70, Cavalcanti foi o responsável pela expulsão do padre Vitor Miracapilo, que atuava na igreja de Ribeirão (PE) e era ligado aos movimentos sociais -o padre se negou a rezar missa nas comemorações do Dia da Independência e foi denunciado como subversivo.
Cavalcanti faz um trabalho silencioso. Em fevereiro, surpreendeu a cúpula governista quando foi eleito segundo presidente da Câmara contra o candidato oficial da chapa do presidente Michel Temer (PMDB-SP).
Depois da visita ao papa, o deputado Severino Cavalcanti falou à Folha, por telefone.
A seguir os principais trechos da entrevista:
*
Folha - Como foi a conversa do senhor com o papa sobre o seu trabalho contra os projetos na Câmara que tratam do aborto, da união civil entre os homossexuais e o veto presidencial à lei que garante ao SUS (Sistema Único de Saúde) o direito de oferecer métodos de contracepção, incluindo a esterilização?
Severino Cavalcanti - A conversa com o papa sobre esse assunto foi mais superficial, porque temos tido conversas com seus assessores, inclusive com o cardeal Trugillo.
O cardeal estará no Brasil em setembro para fazer uma conferência na Câmara para todos os parlamentares cristãos, todos os que acreditam em Deus e que aceitam em princípio a existência de Deus.
O papa vai estar no Brasil (a visita está marcada para outubro) para levar uma benção a todos os casais de brasileiros para solidificar a família.
Para que a nação possa realmente progredir é necessária a existência da união familiar.
Folha - No encontro com o papa, houve alguma orientação especial a respeito da atuação contra os projetos?
Cavalcanti - Ele ressaltou o trabalho que estamos fazendo. É um grande incentivo em se tratando de uma figura como ele.
O papa nos dá tremenda confiança de que estamos dentro da linha certa.
Folha - O que o sr. fez para impedir a votação do veto da esterilização que contava com um acordo entre os líderes de todos os partidos governistas e de oposição?
Cavalcanti - Nós tínhamos que manter o veto. Ele representa o pensamento da comunidade cristã no Brasil. A iluminação divina caiu nos parlamentares, que não votaram.
Folha - Qual será a estratégia daqui para frente, principalmente depois do encontro com o papa, para tentar barrar a votação dos projetos na Câmara?
Cavalcanti - É a hora da união de todos. Vamos trabalhar para diminuir a distância existente entre uns e outros.
Sem querer misturar as coisas, veja a situação de Cuba. O americano quer continuar com a perseguição ao povo. Isso não há mais razão de ser.
Os americanos querem sufocar por todos os meios o bravo povo cubano. Apesar da minha posição sempre contra Fidel Castro, acho que não podemos deixar que um país sufoque o povo cubano.
Folha - O que aconteceu com o sr., um radical anticomunista?
Cavalcanti - Há uma diferença. Ser contra o comunismo não é ser contra o povo. Não é ser contra os que precisam de apoio.
São 35 anos de embargo a Cuba e nós não podemos concordar com esse embargo quando ele não existe mais para a China, que é uma nação muito poderosa.
Os Estados Unidos estão sufocando uma nação pequenina evitando que o povo cubano possa realmente viver.
Não existe mais a luta ideológica, mas a luta pela sobrevivência, pelo amor, pelo carinho. Sou contra o comunismo, mas não há mais razão para estar lutando contra o povo cubano.
Temos que fazer com que todas as nações se juntem e façam com que os americanos acabem com esse odioso embargo que é contra os princípios cristãos.
Folha - Como será sua atuação contra o embargo a Cuba?
Cavalcanti - Estive em Cuba (em 1995) e vi a necessidade de o povo viver.
A visita do papa a Cuba (marcada para janeiro de 1998) é exatamente para mostrar a necessidade de se cuidar de todos os irmãos com a mesma igualdade.
Já estive com todos os parlamentares católicos em Cuba, México, Buenos Aires e voltaremos a falar sobre isso. Temos que juntar nossos esforços.
Folha - O que o levou a mudar tanto de opinião sobre Cuba?
Cavalcanti - Quem mudou não fui eu, foi o mundo que mudou por completo. Hoje tenho o apoio total da Igreja e isso atesta que eu tinha razão na época da expulsão do padre Miracapilo.
A Igreja que, para servir a Deus, só servia às coisas terrestres, como o padre que só se preocupava com invasão de terras, voltou para o lugar que era.
A Igreja para servir a todos nós e não pregar a luta contra irmãos.
Folha - Da mesma forma que o fim do embargo a Cuba é uma luta pelo amor, não é também uma atitude de amor permitir a união civil entre homossexuais, acabando com a discriminação?
Cavalcanti - A união civil já existe. Quem quiser dar o seu patrimônio a uma pessoa que gosta e que tem amor e carinho por ela é só fazer a doação, o testamento.
O que querem é fazer o casamento homossexual.
Aprovar a lei da união civil e depois partir para outra, quando não há necessidade disso.
Já temos todos os meios para fazer doações, se o problema é de garantia de bens.
Folha - E no caso da esterilização. As pessoas não devem ter o direito de escolher o seu método de planejamento familiar?
Cavalcanti - Sou a favor do planejamento familiar, mas não podemos induzir, levar alguém a ser forçado a fazer esterilização para evitar o aumento populacional.

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