São Paulo, domingo, 18 de maio de 1997
Texto Anterior | Índice

Das telas para sua casa

MARCELO MANSFIELD
ESPECIAL PARA A FOLHA

Desde o princípio, a TV foi o substituto lógico do rádio, de onde vieram os astros e as estrelas do novo veículo.
Até o prédio da TV Tupi, a "pioneira", ficava no mesmo terreno que os estúdios da rádio, onde, em poucos passos, aquelas vozes famosas ganhavam rostos. Só que, agora, maquiados para as câmeras.
Embora o lógico fosse que essa nova safra de atores, os de televisão, viesse do cinema, onde já estariam mais acostumados com o vai-e-vem de câmeras, isso não aconteceu. Alguma coisa faz com que artistas do cinema não se encaixem na televisão. E vice-versa. Apesar de os nossos "diretores de cinema" só acreditarem em estrelas de novela, com a desculpa de garantir bilheteria. Desde quando as pessoas vão pagar pra ver o que têm de graça em casa? Bobagem.
Lucille Ball, a maior comediante da televisão mundial, amargou anos em papéis sem importância na RKO, Columbia e Metro, antes de se arriscar com o marido Desi Arnaz a produzir seus próprios filmes... para a televisão. Jack Benny, rei do rádio dos anos 30 e 40, e nas décadas seguintes verdadeiro ídolo da televisão norte-americana, a ponto de colocarem seu nome no auditório da CBS, fazia piada sobre suas raras aparições no cinema, principalmente sobre determinado filme, "The Horn Blows at Midnigth", considerado por muitos como um dos piores da história de Hollywood.
No Brasil, a coisa foi pelo mesmo caminho. Marina Freire fizera com perfeição a ridícula solteirona de "Sinhá Moça" e a sóbria e decidida dona da casa de repouso em "Floradas na Serra". E sempre foi uma ótima atriz característica nos nossos filmes. Quando foi para a telinha, alguma coisa se perdeu: sua interpretação tornou-se exagerada e sem o brilho e carisma que demonstrara na Vera Cruz.
Ruth de Souza, graças aos seus inúmeros trabalhos no cinema, chegou a empatar com Katerine Hepburn, no festival de Berlim, o prêmio de melhor atriz por sua perfeita interpretação no mesmo "Sinhá Moça". Na televisão, seus papéis são de pouca importância, talvez porque os diretores de plantão não acreditem, ou não vejam, seu monstruoso talento para outra coisa que não o velho e desgastado papel de empregada.
Eliana Macedo foi "A" namoradinha do Brasil cinematográfico, mas nem de longe teve o mesmo impacto na televisão. Num de seus últimos trabalhos, "Feijão Maravilha", contracenava com Anselmo Duarte, como nos velhos tempos da Atlântida. Mas quem esperava uma volta da dupla se decepcionou. Não funcionou na televisão.
No entanto, há exceções: José Lewgoy continua nos dois veículos e transita por eles com a mesma segurança. Zezé Motta e Zezé Macedo, também. O grande Oscarito chegou a ter seu próprio programa de TV. Mas quem se lembra? O culto fica para o Oscarito do cinema. Lídia Mattos foi estrela de Humberto Mauro. E faz TV sempre que pode. Odete Lara e Norma Benguel, dizem que não gostam.
Diretores de cinema também não são muito amigos da telinha, com exceção de Carlos Manga. Ou de Arnaldo Jabor, que trocou de lado: faz seus comentários de frente para a câmera.
Mas de quem é a culpa? Sabe-se lá. O que sabemos é que uma estrela como Gilda Nery -maravilhosa no já citado "Floradas na Serra", onde seu nome seguia o de Cacilda Becker, engraçada em "Uma Pulga na Balança" e protagonista em tantos outros filmes- hoje em dia tem de aceitar fazer papeizinhos sem importância na TV, onde é escalada e dirigida pelas mesmas pessoas que descobriram suas vocações assistindo a seus filmes na sessão da tarde. Da TV.

Texto Anterior: Record improvisa cenário de série
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.